Estilo hygge: a união entre o aconchego e simplicidade
Os padrões de comportamento, da moda, do design, da arquitetura e de tantos outros segmentos de trabalho e das relações humanas sofrem, de tempos em tempos, mudanças que também alteram o mercado profissional e as interações na sociedade.
Tais mudanças são motivadas por diferentes fatores. Seja por crises financeiras, como o crash da bolsa de Nova York, em 1929, seja por conflitos como a II Guerra Mundial na década de 1940. Há ainda alguns fatores menos catastróficos, mas igualmente capazes de provocar transformações nos negócios e no comportamento humano: o clima de uma região, por exemplo.
Mesmo com tantas questões negativas que acabam prejudicando o ser humano de alguma forma, a busca por conforto e bem-estar é incessante. Crise após crise, guerra após guerra, seja no frio cortante ou no calor escaldante, o ser humano sempre busca alternativas que possam garantir mais saúde e qualidade de vida — seja em grandes celebrações ou nas simples e pequenas coisas.
Os italianos adoram uma refeição em família no domingo, na casa da matriarca. Os ingleses são pontuais quando o assunto é o famoso chá das cinco. Os norte-americanos se esbaldam em seus jantares de Ação de Graças. E os brasileiros aproveitam diversos momentos de relaxamento para alívio do estresse, como um happy hour em uma sexta após o trabalho, um churrasco entre amigos ou um jantar em casa com os familiares.
Cada nação tem o seu “momento” favorito que remete ao bem-estar, à segurança, ao conforto emocional e à qualidade de vida de modo geral. Uma hora em que os problemas, angústias, tristezas e ansiedades ficam de lado e os pensamentos bons e memórias positivas se afloram e provocam uma sensação agradável, de êxtase e alegria.
Quando o assunto é felicidade, automaticamente pensamos na Dinamarca. Nos últimos anos, o país nórdico sempre esteve no topo ou entre os países considerados mais felizes do mundo. Em dados e informações levantadas pelo Happiness Research Institute, viu-se que os dinamarqueses, em termos de bem-estar e qualidade de vida, estão muito bem-servidos e satisfeitos.
Tudo isso também devido a um “momento” que eles gostam de praticar e cultivar: o Hygge.
2. O conceito por trás do estilo dinamarquês
Mesmo sendo um termo dinamarquês, a palavra Hygge é simples e fácil de pronunciar. Em inglês, seria algo como “Hooga” e, aportuguesando o termo, soaria como “Ruuga”.
Ainda que seja mais falada (e aplicada) na Dinamarca, a palavra Hygge é de origem norueguesa e significa bem-estar. A adoção da expressão pelos dinamarqueses tem explicação. Durante mais de 500 anos, a Dinamarca e a Noruega eram unidas em apenas um reino, até que se separaram em 1814, mesmo período em que a palavra Hygge começou a figurar na literatura do país.
Para os dinamarqueses, o Hygge é algo muito maior que um simples sentimento. Trata-se de um momento, uma memória, um lugar e diversas outras coisas que representam a felicidade para eles. São diversos elementos que misturam sensações, trazem de volta lembranças e garantem conforto, segurança e comodidade de uma só vez.
As condições climáticas do país não favorecem a realização de atividades fora de casa ao longo do ano. Não é comum visitar parques e fazer piqueniques, aproveitar o calor em uma praia litorânea ou desfrutar de um descanso offline no campo. Na verdade, isso é até possível, mas em um período bem curto do ano.
A Dinamarca também é reconhecida por ser muito fria durante praticamente todas as estações. No verão, entre junho e agosto, há temperaturas agradáveis em torno dos 25° Celsius e com luz do sol. Porém, o clima local é imprevisível e, mesmo no verão, o país pode ser tomado por chuvas em abundância.
O ambiente predominantemente nublado e cinza ocorre nas diferentes estações do ano. São raros os momentos de sol e calor no país. No inverno, por exemplo, é comum presenciar temperaturas negativas e neve.
O fator climático reflete diretamente no comportamento dos dinamarqueses. O frio faz com que eles passem bastante tempo dentro de casa, e, para manter o posto de país mais feliz do mundo, é necessário pôr em prática o Hygge. Segundo a pesquisa do Instituto da Felicidade, 71% dos dinamarqueses preferem praticar o Hygge em seus lares, onde ele é altamente valorizado e bem-aproveitado.
O lugar, a decoração, as bebidas, a comida, a roupa, todo o ambiente é composto de modo que uma atmosfera seja criada para oferecer uma experiência única, relevante e marcante. É um momento em que os bens materiais são menos importantes.
Hygge é sobre passar tempo com as pessoas amadas. Sobre se sentir seguro e protegido dos males do mundo e em um momento em que se possa “abaixar a guarda”. É sobre ficar em casa discutindo assuntos complexos ou os temas mais banais do planeta, ou simplesmente desfrutando do silêncio enquanto degusta um café, um chá, um vinho ou qualquer bebida que traga esse tipo de sensação.
3. O apelo aos sentidos humanos
O Hygge é praticado para agradar todos os sentidos humanos. O objetivo é criar a atmosfera ideal a fim de que a visão, olfato, paladar, tato e audição estejam em plena harmonia, favorecendo uma sensação de bem-estar, conforto e segurança, principalmente dentro de casa.
Se quiser gerar esse clima, é necessário ficar atento em alguns padrões de arquitetura, design e decoração. Na Dinamarca, há uma certa obsessão por design de interiores. As casas são consideradas as bases do Hygge. É onde há a centralização da vida social, pois bares e restaurantes em cidades como Copenhague costumam ser muito caros até mesmo para os nativos.
Para criar tal atmosfera, o ideal é ficar atento a algumas questões básicas, mas essenciais para o bem-estar. Entre elas, podemos citar:
- iluminação;
- climatização;
- conforto;
- abrigo.
São os pré-requisitos básicos para ter uma casa que apresente os valores e princípios do Hygge, com a tal atmosfera que traga prazer aos sentidos e bem-estar ao corpo inteiro.
4. O uso do Hygge na Europa
O conceito de Hygge foi adotado por quase toda a Europa. A expansão da decoração escandinava e, consequentemente, do estilo de vida dinamarquês pode ser encontrada nos quatro cantos do continente com facilidade.
No ritmo acelerado em que vivemos atualmente e com a correria do dia a dia, é necessário tirar um tempo para si — e isso é possível até nas grandes metrópoles. Uma atmosfera aconchegante, perfeita para curtir a doçura do “não fazer nada” (o famoso dolce far niente dos italianos, por exemplo), sem se sentir culpado por isso. Fazer o bem para nós mesmos e para os outros, sem cobranças e sem pressão.
E como os europeus produzem esse efeito? As decorações são quase sempre dotadas de velas, lareiras, espaços que proporcionam um bom odor, um barulho que acalma, e principalmente, o aconchego.
A valorização de materiais naturais como a cerâmica e a madeira, e a apropriação de ambientes “limpos”, uma bela poltrona e uma estante de livros que poderá criar o seu lugar de descanso para tomar um bom vinho após um dia de trabalho. Investir em cada canto da casa, com um uso específico e um toque especial.
Mesmo em apartamentos pequenos é possível ter cozinhas interativas (ainda que compactas) e uma mesa de jantar que possa proporcionar uma reunião com amigos a fim de apreciar uma boa comida e jogar conversa fora, esquecendo do celular e sem perceber o tempo passar.
Além de trazer comodidade aos ambientes internos, na Europa vemos muito a valorização do aconchego externo. É comum restaurantes que se apropriam de calçadas e bangalôs nas ruas, sempre convidativos e com uma aparência de lugar confortável para curtir o momento. Nas casas, é bastante frequente o uso de mesas ao ar livre, espreguiçadeiras, lugares perfeitos para aplicar o uso da filosofia Hygge em contato com a paisagem nas quatro estações do ano.
Os europeus valorizam a apreciação das pequenas coisas, a criação de espaços para interagir com amigos, ou simplesmente curtir a sua própria companhia, se fazer presente por completo em cada momento.
5. Cinco dicas para incorporar essa proposta
Se quiser adotar o Hygge em uma casa, são necessárias coisas simples, além de cuidado e zelo. Observe as nossas sugestões:
5.1. Velas
O primeiro fator a ser considerado é a iluminação do local. Na Dinamarca, o uso de velas para criar esse tipo de atmosfera é muito comum. 85% dos dinamarqueses associam as velas diretamente ao Hygge, em especial durante o outono e o inverno, em que as temperaturas mais baixas permitem que o uso de velas seja útil não apenas para iluminar, mas também para aquecer salas, quartos e até mesmo banheiros.
Portanto, definir espaços para o uso de velas é fundamental em um ambiente Hygge. É importante ressaltar a segurança, afinal, o uso de fogo dentro de casa pode ser arriscado. Castiçais e locais estratégicos e protegidos para as velas são essenciais.
5.2. Lâmpadas
Quando se fala de iluminação, não só as velas devem ser consideradas. Lâmpadas têm um papel importante na composição do ambiente. Os dinamarqueses são muito criteriosos ao escolherem as suas lâmpadas. De modo geral, elas são posicionadas para estabelecer pontos de luz calmantes nos diferentes cômodos da casa.
A Dinamarca, inclusive, é reconhecida por ter designers famosos na fabricação de pendentes e luminárias. Poul Henningsen, Arne Jacobsen e Verner Panton são alguns deles. Entre os modelos mais conhecidos, estão:
- The PH lamp: criada por Henningsen em 1925, oferece uma luz leve e difusa por meio de camadas de sobras para dispersar a luz do bulbo;
- Le Klint: Peder Vilhelm Jensen-Klint foi seu inventor. A luminária tem pregas dobráveis como o seu grande diferencial no design.
- Panton VP Globe: um pendente que forma uma luz calmante e difusa vinda de seu aro central. Foi desenhada em 1969 por Verner Panton.
As lâmpadas e luminárias são capazes de dar o tom no ambiente. Os dinamarqueses preferem luzes mais calmas e pouco brilhantes, tudo isso para garantir conforto e calmaria aos olhos. A iluminação é parte importante na composição de um local aconchegante.
5.3. Hyggekrog
O termo pode ser traduzido como um recanto. É um lugar em um cômodo propício para se sentar ou deitar e relaxar, seja lendo um livro ou tomando um chá, envolto de cobertores e almofadas macias.
Para a criação desse recanto, é necessário um sofá ou cama que garanta muito conforto. A função do local é oferecer proteção e comodidade, um tipo de porto seguro nos momentos estressantes, de alta ansiedade ou tristeza. No Hyggekrog, todos devem ter a sensação de que estão no controle da situação, sem se sentir expostos a imprevistos e problemas.
5.4. Madeira
Objetos, móveis e pisos de madeira provocam sensações agradáveis. O cheiro de uma mobília antiga, o toque de uma cadeira de balanço ou o leve chiado de um piso causam bem-estar por meio da simplicidade e naturalidade. A madeira nos faz sentir próximos à natureza.
5.5 Natureza
Só a madeira não é suficiente. Os dinamarqueses têm a necessidade de trazer a natureza por inteiro para dentro de casa. Folhas, galhos, castanhas, tudo que remeta a árvores e animais é bem-vindo.
Assim como vasos de plantas e flores que têm o poder de purificar e perfumar o ar, objetos que identificam a natureza também são capazes de proporcionar calma e conforto ao lar.
Esses são os principais aspectos que agregam valor ao Hygge. Com esses cinco elementos básicos, já é possível criar uma atmosfera que detém todos os princípios e valores desse estilo consolidado e utilizado na Dinamarca e em outros países da Europa. Para deixar o clima ainda mais Hygge, considere adicionar os seguintes fatores:
- livros;
- cerâmicas;
- estilo vintage;
- cobertores, almofadas e mantas.
Tudo isso para a criação de um ambiente agradável, confortável, seguro e prazeroso, que possibilite momentos de alegria e felicidade e a construção de memórias que durem para sempre.
6. Conclusão
O Hygge faz parte do cotidiano dos dinamarqueses, e diferentes pessoas e nações do mundo inteiro estão aderindo à vertente na busca por momentos mais alegres e um estilo de vida tranquilo. Entretanto, é importante considerar que cada nação ou indivíduo faz adaptações segundo o seu perfil cultural, financeiro e local.
No Brasil, por exemplo, que tem condições climáticas praticamente opostas às da Dinamarca, o Hygge deve ser adaptado de acordo com as características do país. O estilo é aplicável em qualquer país e para todo tipo de público, desde que a identidade e essência de cada pessoa ou nação seja considerada e respeitada.
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