Há diferentes formas de pintura. Embora a clássica seja a mais exaltada, o abstrato traz valor, significado e subjetividade. Um desses exemplos é o grafismo. Com as primeiras manifestações, ocorridas há milhares de anos, até hoje é uma tradição passada de geração em geração.
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Mais que uma tendência estética, o grafismo é uma manifestação cultural, uma forma de comunicação e um status em determinado povo originário.
A seguir, você vai entender o que é, quais os seus tipos e como ele se manifesta na decoração. Confira!
O que é grafismo?
O grafismo é um tipo de arte visual que surgiu da cultura indígena e, hoje, é presente em diversas manifestações artísticas — quadros, tatuagens e até mesmo na decoração de uma residência.
No grafismo, as linhas seguem um equilíbrio e ritmo constantes, formando desenhos que identificam determinados povos indígenas. Contudo, é também perceptível em culturas africanas.
Ancestralidade
Muitas pessoas utilizam o grafismo pela estética. Porém, nem todo grafismo representa alegria. Alguns traçados podem significar tristeza, luto ou até mesmo a quantidade de filhos de um determinado indivíduo.
Há uma série de simbolismos que, embora não sejam perceptíveis como em ilustrações tradicionais, trazem significados muito representativos para alguns povos.
Um grafismo pode determinar a identidade de um coletivo, mostrando a um indígena a qual povo outro indivíduo pertence. Ele também pode ter simbolismos mágicos e cosmológicos; tudo depende a quais grupos está atrelado.
Comunicação e arte
O grafismo é uma manifestação estética refinada, que pode demonstrar delicados valores de uma cultura, como força, crenças e valores.
Pintar-se com esses símbolos também é uma forma de demonstrar resistência ao colonialismo, mantendo a tradição de um povo.
Grafismo corporal
Esse tipo de arte é comumente vista como pintura corporal — e é nesse contexto que ganha mais significados. É, como dito, uma forma de comunicação entre um indivíduo e outro de povos diferentes.
Além da parte estética, ele pode estar relacionado ao papel social daquela pessoa em sua comunidade.
Um grafismo pode significar, além do número de filhos, uma identificação entre aldeias, o estado civil e até algum tipo de rito.
Por ser uma ferramenta de comunicação tão importante, a técnica é ensinada desde a infância pelos indígenas em suas atividades cotidianas. Assim, é uma prática passada de geração em geração, que não se perde com o tempo.
Cores
O grafismo indígena é feito com materiais encontrados na natureza. Por isso, é comum que as cores predominantes sejam vermelho (extraído do urucum), marrom, branco e preto.
Educação infantil
Além de símbolo cultural, o grafismo tem sido adotado como recurso na aprendizagem infantil. A criança pode tanto fazer os desenhos quanto pintá-los.
Esse tipo de arte ajuda no desenvolvimento da coordenação motora, do processo cognitivo e da criatividade ao ampliar seu conhecimento de cores, imagens, linhas, formas e detalhes.
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Grafite e grafismo são a mesma coisa?
Apesar do nome parecido, grafite e grafismo não se referem ao mesmo tipo de arte.
Derivado de "grafitto", grafite é um tipo de arte que se refere a inscrições feitas em muros, paredes de edifícios e até mesmo no chão, que costumam refletir costumes, críticas e tendências estéticas de uma cultura, região ou classe social.
Há relatos de sua existência desde o Império Romano, em que os cidadãos escreviam relatos do dia a dia, piadas e até críticas ao governo.
Nas catacumbas romanas, onde se escondiam os cristãos para fugir da perseguição romana, também há desenhos retratando a vida de Jesus.
Até mesmo a arte pré-histórica pode ser considerada um tipo de grafite, já que também retrata a cultura dos povos da época.
O grafite, porém, só foi se tornar popular durante as décadas de 1960 e 1970, com temas como transgressão e contracultura em alta.
A transcrição nos muros era uma forma de protesto, principalmente na periferia, como o distrito do Bronx, em Nova York, nos Estados Unidos.
Já o grafismo é um caminho estético de repetição de linhas que formam desenhos geométricos.
É possível, por exemplo, fazer um grafite com grafismos, mas não necessariamente o contrário — já que o grafite se refere muito mais ao espaço em si e ao que é comunicado do que ao estilo de desenho.
Quais os principais tipos de grafismo?
O grafismo se diferencia pela direção de suas linhas. Veja:
Convergentes
As linhas saem de pontos diferentes e se encontram em uma mesma direção.
Divergentes
As linhas partem de um mesmo ponto e seguem para direções diferentes.
Paralelas
Estão sempre lado a lado seguindo a mesma direção, mas nunca se cruzam. A distância entre uma e outra também é sempre a mesma.
Perpendiculares
As linhas se cruzam formando ângulos retos (90º).
Grafismo indígena: identidade e resistência
Entre os indígenas, o grafismo é uma espécie de herança que conseguiu resistir à colonização e ao passar dos séculos. Caracteriza-se assim toda a arte gráfica geométrica produzida por povos indígenas dentro do território brasileiro.
Ele se mantém como uma forma de comunicação, de manifestação de religiosidade e até mesmo de status dentro das comunidades.
O grafismo aparece na pintura corporal, nos cestos, na cerâmica, no artesanato com miçangas e em diversas manifestações artísticas. Cada povo desenvolve um ou mais tipos de desenho.
A tinta
Como dito no início, o grafismo indígena é feito com materiais naturais, como urucum, jenipapo, mogno, açafrão e pau-brasil.
No geral, os pigmentos são extraídos das plantas, mas também podem ter origem animal, mineral e até mesmo de microrganismos.
O saber tradicional permitiu o desenvolvimento de diversas técnicas para a extração de tinta. Algumas sementes podem ter seu corante extraído quando espremidas; já outras precisam ser fervidas, raladas e peneiradas.
O urucum exige a fervura prolongada. Depois disso, é preciso deixar o pigmento esfriar para, aí sim, aplicá-lo no corpo.
Outro fator importante é que cada semente gera um tipo de cor. O urucum gera o pigmento vermelho; o preto é formato por uma mistura de jenipapo e fuligem; o amarelo, do açafrão; o branco, da tabatinga.
Significado
Como você viu, cada povo indígena desenvolve seu grafismo. Isso não significa, claro, que os desenhos não vão se repetir. A sequência de traços pode até ser a mesma, mas o significado muda — e muito — entre cada etnia.
Algumas pinturas também estão ligadas a significados considerados mágicos e cosmológicos pela comunidade.
Mas, antes de tudo, o grafismo carrega ancestralidade. É como contar parte da história de um povo apenas com as pinturas feitas no corpo ou em um objeto.
Mesmo que o significado mude e que um indivíduo de fora não necessariamente o entenda, expressá-la por meio do grafismo já demonstra coragem e orgulho.
Um grafismo pode significar status civil e social, visões de mundo, valores tradicionais da comunidade, religiosidade, cosmologia e muito mais.
Por ser uma ferramenta de comunicação, o grafismo indígena é ensinado ainda na infância. Assim, ocorre a preservação e a perpetuação das tradições, além de um fortalecimento do laço entre o indivíduo e sua aldeia.
Grafismo Guarani
O povo Guarani foi um dos primeiros a ter contato com os europeus após o desembarque na América do Sul.
Sua história, claro, é contada por meio de grafismos que estão presentes tanto nos objetos ritualísticos quanto domésticos.
Mas é importante lembrar que seu artesanato — e, consequentemente, o grafismo retratado nele — tem uma forte ligação com Nhanderu, o ser criador na cultura tupi-guarani.
Os desenhos também têm a ver com o sistema e o comportamento da etnia. Por exemplo: um grafismo pode retratar o caminho feito de uma aldeia para outra.
Já desenhos semelhantes a estrelas significam uma forma de contagem relacionada à caça. Funcionam como uma forma de homenagear os homens que saem pela mata e conseguem trazer animais para o consumo da comunidade.
Já no balaio, o padrão da cobra-coral, segundo a mitologia, protege os alimentos que estão dentro dele.
Comércio
Atualmente, o povo guarani desenvolveu grafismos sem significados sagrados para comercializar com os juruás (não indígenas).
Assim, o cliente pode ter um desenho feito por um artesão indígena, colorido e com características da comunicação desenvolvida em determinada aldeia, mas sem um sentido voltado ao divino.
Esse tipo de "arte comercial" é muito vista nos colares. Feitos de miçangas compradas na cidade, eles podem ser usados tanto pela artesã quanto por pessoas de foram.
Além dos grafismos, as artesãs (os colares são sempre feitos por mulheres) podem escrever o nome do usuário e do time de coração em português ou guarani, flores, animais, estrelas, o sol e ícones simbólicos para a comunidade.
Já os feitos com sementes, elementos sagrados para o povo guarani, têm como objetivo proteger a pessoa que o usa.
"Arte primitiva"?
É bem comum que alguém chame o grafismo indígena de uma manifestação de "arte primitiva". Apesar de serem povos originários, os grafismos brasileiros são, na verdade, um complexo código de comunicação entre integrantes de uma mesma comunidade ou entre etnias distintas. Portanto, uma arte pode ser ancestral, mas nem por isso simplória ou primitiva.
Como o grafismo se manifesta na arquitetura?
Arte, moda, arquitetura e decoração se intercalam. Por exemplo: tendências vistas em determinados grupos acabam se tornando tendência em massa, como ocorreu com o jeans usado pelos trabalhadores ingleses e aderido pelo movimento punk.
Na arquitetura e na decoração, não seria diferente. Temáticas como arquitetura escandinava e a japonesa têm traços muito específicos e se tornaram tendências dos segmentos.
Veja como o grafismo se manifesta na composição interna e externa de residências:
A maneira mais fácil de inserir um grafismo na sua decoração é por meio de quadros. Eles podem ser inseridos em qualquer lugar, até que se encontre um ambiente que combine com suas cores e traços.
No ambiente acima, o quadro com grafismos se camufla no ambiente, em que a repetição de cores é expressa por elementos orgânicos ou de cor terrosa. Até as sombras que desenham a parede trazem um desenho que lembra os grafismos indígenas.
A pintura na parede também é uma forma moderna de adotar o grafismo. No banheiro, há uma "quebra de expectativa", com o desenho contrastando com a decoração mais vintage do ambiente.
O contraste dos quadros preto e branco se complementa com a parede preta. O desenho cíclico, sem início e fim aparentes, rouba a atenção na decoração neutra, com predomínio do preto.
O grafismo, aliás, mostra que a cor pode ser neutra, mas não necessariamente sem graça.
Na sala acima, os quadros trazem grafismos bem distantes do estilo indígena ou africano.
Apesar de a estrutura ser parecida, com repetição de traços, o uso de ângulos e a criatividade nos desenhos possibilitou uma modernização que foge do que pode ser considerado sagrado ou profano por diferentes povos.
Viu como o grafismo é mais do que um simples desenho? Parte intrínseca da cultura, ele é também manifestação estética e histórica de cada povo que o constrói.
E para continuarmos em gêneros de arte, confira como o avant-garde se manifesta na arquitetura!
Interessante
Bom dia ,estou mesmo impressionada com à arte grafismo: sempre vi e achava muito interessante mas não sabia a origem.
Trabalho muito bom. Estou estudando esse tema.
Obrigada por compartilhar.
Me ajudou bastante porque eu vou fazer um trabalho com esse tema. obrigada