A vez do feito à mão
Vivemos tempos inovadores, marcados pela supremacia da tecnologia. Na contramão desta transformação, está o Maker Movement (Movimento do Fazer, em tradução livre), tendência mundial que atrai pessoas para o fazer manual, incentivando o surgimento de uma legião de fazedores e não apenas de consumidores. No guarda-chuva dos makers cabem os artesãos, os designers, os pensadores, que, ironicamente, se valem da tecnologia para desenvolver, trocar e compartilhar os seus trabalhos.
Esta filosofia não acontece por acaso e tem a ver com o lifestyle da geração Y, formada pelos nascidos entre os anos de 1980 e 2000, que, sim, preocupa-se com a origem do que consome. Não à toa, salpicam marcas de sapatos veganos, roupas de algodão orgânico, alimentos orgânicos, feiras especializadas em produtos manuais... Gente que foca seus gastos em experiências por trazerem mais felicidade do que a compra de objetos. Ok, você não é um millenial, mas provavelmente gosta de produtos únicos, genuínos, aqueles que, quando os seus amigos chegam em casa, você tem uma bela história para contar sobre como foram feitos, sobre os saberes ancestrais que carregam, sobre os materiais de que são feitos. Estes produtos nos encantam e nos emocionam e são vitais para aplacar o estresse diário. Em meio a tantos estímulos, precisamos nos rodear de coisas que confortam, que tenham alma.
A relação das pessoas com as marcas mudou. Elas querem mais custo-benefício e verdade nas vendas. Empresas precisam ter propósitos, abraçar causas. Apesar do constante aprimoramento da tecnologia nas fábricas, algumas marcas já se dedicam ao feito à mão, contam histórias e traduzem a força do trabalho manual. E é neste cenário que os holofotes se voltam para o artesanato, atraindo a atenção da mídia e de designers, que têm realizado deslumbrantes trabalhos ao lado de artesãos, dando origem a cobiçadas coleções de design feito à mão. Os indígenas do Amazonas têm o conhecimento da cestaria e das suas possibilidades de tramas e materiais. O designer Sergio Matos chegou com o design e as noções de mercado para juntos criarem produtos que ressuscitaram, deram fôlego a um desgastado saber, que poderia ser extinto, como tantos outros pelo Brasil. Segundo Matos, ganham os designers, que aprendem novas técnicas, e os artesãos, que recebem uma nova visão do mercado e pensam em produtos mais contemporâneos. “E a gente ainda consegue manter uma técnica ou até mesmo resgatar outras que já estavam perdidas”, conta o designer.
Veja o que fez Liliane Rebehy, diretora criativa da grife Coven. Ao visitar o Vale do Jequitinhonha, em Minas Gerais, ela conheceu os trabalhos das bordadeiras e tecelãs locais. Inspirada por elas, trouxe para a recente coleção de inverno da marca os tons do Vale e os traços de Diogo, filho de uma das bordadeiras. Camisetas e camisas exibem os desenhos do rapaz e foram bordados pelas próprias artesãs. Essas peças convertem fundos e reconhecimento ao ofício das profissionais. Nasceu assim, uma coleção brasileiríssima, contemporânea, com valor, história e propósito.
Recentemente, a loja de móveis Terrasse, em Teresina, PI, virou assunto ao promover a exposição “Ditos do Espedito”: uma seleção de importantes cadeiras e poltronas do design revestidas com o trabalho em couro do mestre artesão Espedito Seleiro. A exposição, que extrapolou a loja e, em breve, chegará a capital paulista, traz versões da Xibô, da Sergio Rodrigues, da FDC1, de Flavio de Carvalho, entre outras, totalizando 15 obras.
E os artesãos? O que eles pensam disso? O tiradentino Wagner Trindade, o Waguinho, aprendeu a fazer luminárias com o pai. Sentia uma inquietação de artista, mas não imaginava que poderia fazer diferente do que aprendeu, utilizando as mesmas técnicas. Participou das imersões do projeto Semana Criativa de Tiradentes e, ao lado dos designers André Bastos e Guilherme Leite Ribeiro (Nada se leva), Daniela Karam, Maria Fernanda Paes de Barros e Paulo Alves viu seus horizontes se abrirem. Descobri que eu era capaz de fazer coisas que nem eu mesmo sabia”, conta Waguinho.
A união do design com o artesanato não é novidade. Em 1993, por exemplo, os Irmãos Campana criaram a cadeira Vermelha, um emaranhado de mais de 450 metros de corda trançados manualmente, que funcionam como estrutura e assento. Alguns anos depois, a grife italiana Edra, interessou-se em produzir a peça e, no lugar de um projeto, recebeu um vídeo contendo o passo a passo de como fazê-la. E pensar que a Itália, meca dos plásticos injetados e da produção em série, colocou em linha uma peça feita manualmente, sem a menor escala. Resultado: a cadeira virou objeto de desejo, assim como tantas criadas pelos Campana, e figura na coleção permanente do MoMa (Museu de Arte Contemporânea de Nova York).
Recentemente, um post patrocinado no Instagram me chamou a atenção. Trazia a seguinte pergunta: por que criar uma marca mais humana com produtos artesanais? A resposta: porque assim temos a oportunidade de agregar mais valor fazendo as pessoas não comprarem um produto apenas, mas a causa que você defende, os princípios e valores que você apoia.
[…] Um artesanato é um artefato realizado manualmente com objetivo mais comercial que artístico. Por isso, é mais acessível que a peça de arte, ainda assim, ele traz uma rusticidade característica. É uma modelagem comprada em uma cidade histórica, ou um objeto carinhosamente feito e oferecido por alguém. Esses elementos, combinados a uma decoração cuidadosa, auxiliam na criação do conforto do ambiente, e ainda contribuem com o valor afetivo do cantinho rústico. […]
Perfeita Matéria Simone, eu super me enquadro nesse Lifestyle da geração Y.