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Participantes do Archtrends Talks interagem com Fe Cortez (Foto: Guto Campos)

O papel do designer e do arquiteto para a cultura regenerativa

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26.03.2021
No último dia da Trend Week Portobello, a ativista Fe Cortez convidou profissionais do Archtrends Talks a olharem de uma outra forma para como nos relacionamos com o planeta em que vivemos.
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Um final para um novo início de reflexões e projetos. Assim propôs o quarto e último dia de Trend Week Portobello com o Archtrends Talks. O evento digital contou com a participação da ativista Fe Cortez para falar sobre um tema tão relevante aos profissionais de arquitetura e design, parceiros da marca: O papel do designer para a cultura regenerativa

Se preferir, clique no play abaixo para ouvir o artigo completo:

Fe Cortez é ativista ambiental, conselheira no Greenpeace, palestrante e idealizadora do Menos 1 Lixo, Movimento e Negócio de Impacto, que promove a educação ambiental e tem o copo de silicone retrátil original do Brasil como símbolo.

A Trend Week Portobello ofereceu durante esta semana eventos online, gratuitos e abertos ao público como parte das atrações paralelas à Expo Revestir. O Archtrends Talks foi mais um encontro virtual que marcou o lançamento da coleção Unlimited Experience. Acompanhe os destaques desse bate-papo com a participação da diretora de Branding da Portobello, Christiane Ferreira.

Durante a tarde de ontem (25), Fe Cortez convidou as pessoas a olharem de uma outra forma para como nos relacionamos com o planeta em que vivemos. Ela propôs alternativas para que possamos evoluir e solucionar os desafios ambientais que nosso estilo de vida nos apresenta.

A história da Fe Cortez

Fe Cortez inicia a conversa falando um pouco de sua trajetória. Ela conta que se formou em moda e trabalhou neste setor durante 10 anos. Logo após, começou a empreender numa agência de conteúdo. Um certo dia, ela assistiu ao documentário Trashed, para onde vai o seu lixo, o qual mostra o resultado de uma sociedade do crescimento industrial ou do descarte: lixo por todas as partes, incluindo uma sopa plástica na ilha do Pacífico. O doc mexeu de imediato com a ativista, principalmente por ter velejadores em sua família e amar a natureza.

A partir daí ela começou a pensar em todas as suas áreas de consumo de plástico, o que poderia eliminar, e chegou então ao copo descartável. Fe Cortez lembrou de um copo retrátil que usou na infância em uma viagem e resolveu resgatar essa ideia. Ela distribuiu aos seus amigos e todos começaram a reparar também em outros materiais provenientes do plástico no dia a dia, como a sacola de supermercado, canudo, entre outros. “Em 2012, percebi que o copo tinha um poder de sensibilização muito grande e amadureci ainda mais essa ideia, resolvi estudar sobre sustentabilidade “, afirma. 

Fe Cortez resolveu lançar um movimento de educação ambiental. Continuou usando o copo e sensibilizando mais pessoas a usarem também, incluindo algumas celebridades. No final de um ano ela economizou 1618 copos e outras pessoas também se engajaram e começaram a comprar o copo do Menos 1 lixo. “Mas o design e a usabilidade não eram bons. Então, passei um ano e meio desenvolvendo um novo protótipo com um design mais atrativo e funcional. Isso foi em 2016, quando consegui ter o copo pronto. De lá para cá, o movimento cresceu muito, influenciando políticas públicas, como a proibição dos canudos de plástico em várias cidades. Já se passaram seis anos e muita coisa aconteceu como ser nomeada defensora da ONU na campanha Mares Limpos e hoje sento no conselho do Greenpeace, que é uma honra”, conta.

Sustentabilidade é um termo defasado

Segundo Fe Cortez, o termo sustentabilidade foi lançado nos anos de 1990, atrelado a mudanças que empresas e indústrias precisariam fazer, na forma como elas trabalhavam, e que elas teriam que olhar não só para o lucro, mas também para a responsabilidade socioambiental. “A gente ainda tinha tempo de percorrer uma jornada que se fizéssemos tudo certo, poderíamos, sim, sustentar o planeta para garantir qualidade de vida para gerações futuras. Mas hoje a gente se depara com uma taxa de 66% dos animais selvagens extintos nos últimos 50 anos pela ação humana; se não mudarmos o consumo, a gente vai ter mais plásticos do que peixes em 2050. Se a gente não mudar a matriz energética mundial, a gente vai cozinhar – literalmente – em menos de 100 anos, porque já aumentou 1,1 graus centígrados em mais ou menos cinco anos por conta da atividade humana”.

A ativista diz para os participantes que nossas ações são feitas de uma forma antinatural. Para ela, todos os dados negativos são frutos de um modelo de economia linear, já que extrai recursos, transforma-os em um produto e não se importa com o pós-consumo. “Por isso sustentabilidade é um termo que não faz mais sentido porque se sustentar um modelo que tem hoje, vai acontecer um modelo que traz morte. A gente tem gerado uma sociedade que mais mata do que gera vida. Isso é muito duro. A parte boa é que ainda temos 10 anos. A ONU chama a “Década da biodiversidade”, uma década também de mudar nossa matriz energética para pelo menos neutralizar as emissões de poluentes na atmosfera e transformar em energia renovável e limpa. É um grande desafio. Temos que mudar nossa lente para fazer com que a nossa espécie sobreviva no planeta e continue sustentando a vida”, ressalta.

Ressurge a Teoria de Gaia

A hipótese Gaia dos anos 70 ressurgiu nos tempos atuais e reforça a realidade de que o clima que temos na Terra é gerado e mantido pela biosfera, ou seja, a vida gera vida. Segundo Fe Cortez, essa teoria também fala que o planeta é um megaorganismo, estando todos hiper-ligados, criando o tempo inteiro condições para manter um equilíbrio. “Dessa maneira, quando a gente vai destruindo as condições que alicerça a vida, vamos destruindo as condições do planeta de se autorregular. Então, de acordo com a teoria dos sistemas, que rege a teoria de Gaia, vai chegar um momento em que não vai ter mais como manter esse equilíbrio. E vai começar a acontecer na Terra eventos emergentes, como por exemplo furacões em lugares que nunca aconteceram, de intensidades maiores, ou chuvas ou secas. E o que emerge não vai dar para fazer uma previsão científica. O desafio dessa década é que a gente regenere o quanto antes o planeta para que, aí sim, a gente volte a falar de sustentabilidade”, explica a ativista ambiental.

O papel do design para a regeneração

“Lixo é um erro de design”, fala Fe Cortez para os profissionais atentos no Archtrends Talks. E complementa afirmando que na natureza não existe esse conceito de lixo, isso é uma ação apenas do homem. “O design precisa se inspirar na natureza porque somos natureza. Temos a capacidade de criar coisas muito complexas com tecnologias muito avançadas, mas a gente precisa olhar para os modelos. Estávamos sobre a influência cultural de uma lógica da separação, a gente está sempre entrando em guerra contra alguma coisa. A praga é uma forma de Gaia sinalizar que existe um problema para que o próprio feedback do sistema faça com que as condições voltem a se normalizar. É nessa lente que estamos todos interligados para pensarmos em regeneração, e o design tem tomado um caminho interessante que é o da biomimética, uma forma de se pensar o design que se inspira na natureza para trazer soluções para qualquer questão”, enfatiza.

Fe Cortez fez um curso chamado Gaia Education com enfoque para Design para a transição, com o intuito de formar líderes que vão fazer a transição dos modelos de design que a gente vê hoje. “Não tive aula de produto, mas sim sobre visão de mundo, ecologia, economia e técnicas de comunicação. Isso é importante para mudar a visão do design enquanto processo de regeneração. Exemplo, um projeto de uma casa, como analisar a luz que entra nesse lugar para que ela use a menor energia possível? Como projetar uma fossa não tradicional que devolva para a natureza a água completamente limpa novamente? Não faz sentido hoje ainda ter tratamento de esgoto que leva as fezes a quilômetros a ser tratado numa estação. Todos os projetos modernos de urbanização preveem microestações de tratamento e também in loco para que a gente não deixe o problema para o outro. Não é sempre o outro que tem que resolver o problema! Precisamos de uma nova ética que responda à vida! A arquitetura pode ser uma enorme solução”, frisa a ativista, citando aos participantes vários exemplos de projetos inovadores nesse sentido para o objetivo de manter a humanidade.

Covid é uma lupa que mostra todos os erros de organização social que nós temos

Os arquitetos e designers do Archtrends Talks começam a interagir com a ativista: Queremos criar algo sustentável, mas encontramos algum tipo de barreira. Como convencer os clientes a incluir no projeto várias dessas ideias?  No copo Menos 1 lixo quis fazer o copo mais lindo e desejado para tornar o descartável obsoleto. Então acho que temos a oportunidade de fazer as casas mais lindas de forma sustentável. A natureza é uma mestre em estética! Agora, se o cliente for sensível ao dinheiro, é preciso dizer a ele que as soluções sustentáveis são econômicas, porém também falar que temos uma responsabilidade em relação ao planeta e as outras casas já estão sendo feitas pensando nisso, então o projeto dele poderá ficar obsoleto em pouco tempo. A tecnologia está avançando muito, conversei com pessoas do setor automobilístico de carro elétrico que falaram que o carro vai ser uma bateria para microgeração de energia, então os arquitetos já têm que pensar assim também porque a casa vai gerar energia solar e esse carro vai ser a bateria que vai armazenar essa energia e depois o carro vai devolver para o grid. Temos que ir sensibilizando os clientes nesse sentido.

Christiane Ferreira dá seguimento às perguntas: Os arquitetos são influenciadores porque vão decidir como serão as cidades e casas daqui para frente. A Portobello também se sente desafiada a trazer mais à tona essa reflexão para os profissionais parceiros e para a sociedade. No Archtrends é uma das formas de fazer isso, mostrando que seus lindos projetos são sustentáveis. Então, uma das perguntas que surgiu agora: sustentabilidade ou ações regenerativas? A instituição Global Footprint Network soma todos os anos em que data do ano a gente consumiu os recursos do planeta e, a partir daquela data, o que a gente não consegue mais regenerar o que estamos consumindo. Cada ano esta data fica mais cedo. Em 2020, a data foi agosto, ou seja, ficamos no débito com o planeta 5 meses. Estamos vivendo de forma insustentável. O Brasil não tem mais o mesmo regime hídrico, desmatamos 92% da Mata Atlântica e agora esse ecocídio na Amazônia. Por isso a gente precisa regenerar porque já destruímos muito. Pelo acordo de Paris, o Brasil se responsabilizou a replantar 13 milhões de hectares pelo o que destruímos por conta do agronegócio do gado. Vamos precisar fixar carbono no solo, então fica a dica para os arquitetos: criar flo-res-ta! Também regenerar o bioma como um todo. Então se a gente sustentar o que está agora não conseguiremos manter a vida. Precisamos elevar essa régua regenerando a teia da vida. Para daqui a uns 20, 30 , 40 anos a gente possa falar em sustentabilidade. Em termos de design, temos que pensar: como eu desenho um produto para ele entrar em uma economia circular e ter um impacto positivo e como criar processos de impacto positivo e como sensibilizar as pessoas para que elas tenham um novo comportamento? A cura maior é as pessoas reconhecerem que elas mesmas fazem parte da natureza.

Fe Cortez vai mais além e opina: os arquitetos que estão sempre em contato com as marcas, com os fornecedores; eles têm o papel importantíssimo de educar a cadeia. Eles têm uma oportunidade incrível de valorizar os produtos feitos no Brasil, as populações tradicionais, o nosso artesanato, o indígena, que no mundo inteiro é valorizado. Isso precisa estar no pensamento das pessoas que estão projetando, é uma responsabilidade. Todos os arquitetos deveriam fazer cursos de permacultura, que tem o conceito de como podemos nos manter num lugar por mais tempo e preservando os recursos daquele lugar e os regenerando. Então uma solução é aliar essa técnica com a estética do estilo de cada profissional.

O que fazer a quem nega os problemas ambientais? Temos a inteligência, a capacidade e a tecnologia para florescer. Se vai acontecer a regeneração, vai depender do quanto a gente se engajar, esse desafio é global. Em relação aos negacionistas, não percam tempo com eles, porque são uma minoria da população, usem a energia de vocês para canalizar para o que é semente e fazer florescer. Direcionem os seus dons para a regeneração de Gaia! 

A diretora de Branding da Portobello completa e conclui essa afirmação da ativista: a Portobello tem um conceito de sustentabilidade que se chama ASAP,  as sustainable as possible, as soon as possible, ou seja, vamos fazer o que for possível agora, dando um passo de cada vez.

QUER SABER COMO FOI TODA A CONVERSA COM FE CORTEZ? ASSISTA AGORA AO VÍDEO:

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