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Intrínseco ao que é humano

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19.10.2017
O design ambientalmente responsável precisa entrar definitivamente na normalidade.
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Existe um cansaço evidente em relação ao termo “sustentabilidade”. A imagem de uma mão segurando uma muda de árvore é simplória e, como toda imagem infinitamente reproduzida, tornou-se vazia de significado. Mesmo envolto em repetição, ideologia ou usado como mera estratégia de marketing, o “clichê verde” serviu para instaurar a consciência da urgência de uma mudança radical dos hábitos – esse, talvez, o grande desafio da sustentabilidade. Criadores de produtos e serviços, designers têm um papel fundamental em influenciar novos comportamentos e agenciar os fatores que determinam o impacto humano no planeta.

O antídoto para o bom-mocismo sustentável é a incorporação definitiva do conceito na normalidade, diz a sempre certeira curadora de design do MoMA, Paola Antonelli, em um texto para a revista italiana Domus. “Está na hora do design ambientalmente responsável, de comércio justo, ecológico, sustentável, ético, zero-desperdício, zero pegadas de carbono, biodegradável e reciclável ser menos ascético e mais humano e vulnerável”, instiga ela. Tal qual vem acontecendo com a tecnologia, os próximos passos da sustentabilidade, se quisermos que seja um valor efetivo, é que se torne indissociável do que é humano. No âmbito do design, sustentável seria apenas mais uma das suas características intrínsecas, tal como forma, função, beleza ou prazer.

Nesse sentido, algumas criações recentes apontam caminhos felizes.

A primeira é da Ikea, gigante sueca do mobiliário low cost. No início do ano, a empresa apresentou uma série de protótipos 100% feitos com materiais reciclados ou reutilizados. Entre eles está um conjunto de armários modulares de cozinha, chamado Kungsbacka, do estúdio Form Us With Love, também sueco. O coletivo de designers criou um modelo sóbrio, de superfície preta fosca e linhas retas. Um design contido, que não grita para revelar sua origem responsável – e que nessa simplicidade formal pretende ser também esteticamente longevo. O compensado é feito de resíduos de madeira, e as superfícies, de garrafas PET (cada 40×80 cm utiliza 25 garrafas – são 100 bilhões produzidas no mundo por ano!). A ambição dos designers era mostrar que a economia circular pode ser feita em grande escala e a um custo acessível – acertar o preço foi o desafio que mais tomou tempo dos desenvolvedores da matéria-prima.

Kungsbacka, Estúdio Form Us With Love para IKEA. Foto Divulgação
Kungsbacka, Estúdio Form Us With Love para IKEA (Foto: divulgação)
Kungsbacka, Estúdio Form Us With Love para IKEA (Foto Divulgação)
Kungsbacka, Estúdio Form Us With Love para IKEA (Foto: divulgação)
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Kungsbacka, Estúdio Form Us With Love para IKEA (Foto: divulgação)

Um estudante de design do Royal College of Art, Ryan Mario Yasin, quer solucionar um problema comum à grande parte da população: a rápida perda de roupas por crianças na primeira fase de crescimento. Petit Pli, seu projeto de conclusão no mestrado Innovation Design Engeneering, consiste em um modelo de macacão feito de uma matéria têxtil “auxética” desenvolvida com nanotecnologia (Yasin tem estudos anteriores em engenharia aeronáutica). A combinação entre o material e a forma plissada da superfície resulta em uma roupinha que pode facilmente se expandir e se contrair, cobrindo tamanhos dos 6 meses aos 3 anos. O material sintético também é a prova d’água, e a criação pode ajudar a diminuir as 300 mil toneladas de roupa que foram descartadas no Reino Unido em 2016.

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Petit Pli, Ryan Mario Yasin (Foto: divulgação)
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Petit-Pli-Ryan-Mario-Yasin (Foto: divulgação)
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Petit Pli, Ryan Mario Yasin (Foto: divulgação)

Na ponta do desenvolvimento tecnológico estão os telhados solares da Tesla. Nessa última inovação da empresa de Elon Musk, a grande sacada foi ter criado um sistema hiper tecnológico com uma aparência comum. Em vez de grandes placas de vidro sobre a cobertura de uma casa, as próprias telhas – feitas de quartzo e com formatos que mimetizam telhados usuais – são capazes de captar a luz solar. Aqui a ambição sustentável de um mundo movido a energia limpa torna-se algo discreto, natural. O bom design faz isso: transforma nossas ambições e desejos em coisas cotidianas.

Solar Roof, Tesla (Foto: divulgação)
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Solar Roof, Tesla (Foto: divulgação)

Objetos que demandam zero desenvolvimento tecnológico e baixíssimo gasto de energia também surpreendem. Em conjunto com um artesão de bambu japonês, o designer alemão Stefan Diez criou um banco e um cavalete de mesa utilizando apenas bambu em estado natural. O projeto tem um desenho engenhoso, fazendo com que o caule, magistralmente cortado, se transforme nos componentes que podem ser montados em poucos minutos, sem a necessidade de nenhuma ferramenta – apenas de uma pecinha de bambu e corda que vem no kit “flat pack”. A coleção Soba mostra como inteligência e sensibilidade transformam poucos recursos em objetos extraordinários.

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Coleção Soba, Stefan Diez (Foto: divulgação)
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Coleção Soba, Stefan Diez (Foto: divulgação)

Vivemos a era do Antropoceno, termo que designa o homem como o maior agente de mudanças no planeta. Sustentabilidade é a grande consequência dessa nova era. É, portanto, um imperativo.

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Livia Debbané
Colunista
Colunista

Jornalista especializada em design. É graduada em Filosofia pela PUC-SP. Trabalhou na revista Bamboo...

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