Quando se fala em inclusão na arquitetura, Gabriela de Matos é um dos maiores nomes da atualidade.
Arquiteta, mineira e afro-brasileira, ela cria projetos multidisciplinares para destacar a brasilidade a partir das lentes da raça e gênero.
Também conhecida como Gab de Matos, ela se destaca por iniciativas e pesquisas que fomentam a inclusão na arquitetura, sobretudo de mulheres negras.
Foi assim que ela conseguiu diversas oportunidades de colocar em prática aquilo que falava. A partir daí, desenvolveu projetos importantes, inclusive para a Portobello, na terceira edição da mostra UNLTD Dreams.
Ela ainda é colunista no Archtrends e coapresentadora do programa de televisão Desapegue Se For Capaz, canal GNT.
Portanto, para falar sobre inclusão na arquitetura, não poderíamos ter convidado outra pessoa para o Podcast Archtrends. Confira nas linhas a seguir um resumo dos melhores momentos da conversa!
Arquitetas Negras mapeia profissionais em busca de inclusão
Um dos projetos de maior visibilidade de Gabriela de Matos é o Arquitetas Negras. A iniciativa reúne contatos de profissionais negras no Brasil.
Dessa forma, ajuda clientes a se conectarem. Uma ideia que parece simples, mas faz uma grande diferença em termos de inclusão na arquitetura. Afinal, hoje já conta com mais de 700 nomes mapeados.
Com a expansão, hoje ela coordena o projeto com outras mulheres negras: Thamires Mendes, Audrey Carolini e Kaisa Santos.
No podcast, Gabriela de Matos explica como é possível encontrar arquitetas negras. “Hoje a gente recebe esse tipo de solicitação por e-mail, gestaoarquitetasnegras@gmail.com, e pelo Instagram Arquitetas Negras também”.
Segundo Gab, para facilitar a inclusão na arquitetura, o plano é, no futuro, criar um site para tornar a busca mais fácil e direta. Outra evolução importante seria o acompanhamento desses contatos. Dessa maneira, seria possível entender quantas pessoas fecharam negócio, qual o nível de satisfação, entre outras questões.
O projeto surgiu com o intuito de fomentar a inclusão na arquitetura. "Afinal, as pessoas pensavam que as profissionais negras produziam projetos seguindo um mesmo padrão. Ou que tinham o mesmo pensamento, e até que faziam parte do mesmo escritório. Além disso, quando se fala de inclusão na arquitetura nesse sentido, também é comum acreditar que todas vieram da mesma situação social e econômica. Não é por aí, nós somos diferentes, nós temos referências diferentes, então os projetos vão ser diferentes”, reforça Gabriela de Matos.
Ela ainda reforça que pensar no coletivo não apaga a individualidade. O que acontece é o contrário, a inclusão na arquitetura potencializa o olhar para a necessidade do outro.
Portanto, no processo criativo, a união com o grupo permite enxergar quão especial é cada um. O resultado são projetos únicos.
Gabriela de Matos conquistou diferentes espaços
Gabriela de Matos é uma profissional com propósito claro. É estudiosa e se destaca pela inclusão na arquitetura. No entanto, não se via ocupando certos espaços.
Quando perguntada sobre quais posições e conquistas ela não imaginava que teria, a resposta foi: “quase todas!”.
E completou: “quando eu passei para a faculdade eu falei ‘eu quero fazer mestrado, eu quero fazer doutorado’, eu tinha uma visão muito voltada para a academia. E ‘quero ter meu escritório’. Se eu conseguir fazer isso, já vou estar realizada”.
De maneira geral, os profissionais escolhem seguir pela prática ou pela academia. Sendo assim, Gabriela de Matos já tinha um grande desafio ao querer conciliar as duas carreiras. Contudo, conseguiu dar conta e ainda ir além.
O mestrado só veio durante a pandemia, que foi quando se sentiu realizada, já que tinha seu escritório.
Sua dedicação pela inclusão na arquitetura, e também em outros aspectos práticos, abriram outras portas. Uma delas foi a CASACOR São Paulo, em que estreou em 2021.
Além disso, foi convidada para ser vice-presidente do Instituto de Arquitetos do Brasil (IAB) no departamento de São Paulo, que é responsável pela Bienal de Arquitetura de São Paulo. Sem falar no lançamento do seu livro.
Gabriela de Matos ainda tem o dom da comunicação, o que a levou a se tornar apresentadora de televisão. Outro trabalho que ela não imaginava que faria parte da sua trajetória, ajudando ainda mais a inclusão na arquitetura.
No Desapegue Se For Capaz, do GNT, seu objetivo é “fazer funcionar uma arquitetura de qualidade, acessível para as pessoas, sem ter que usar as coisas mais caras do mundo, reutilizando as coisas. Tem uma coisa de sustentabilidade também, o que é bom a gente pode reutilizar”, conta.
Maternidade trouxe novo olhar pessoal e profissional
Carreira acadêmica, pesquisas, projetos, televisão, maternidade… O dia a dia de Gabriela de Matos certamente é bastante atarefado.
“Eu sou mãe de uma menina de seis anos, que é a Aurora, a alegria da minha vida. Preenche muito, é minha parceira, e está em muitos eventos comigo desde bebezinha”, conta.
Ela ainda relata que sua vida mudou após a maternidade. Um exemplo é a organização da rotina, que hoje gira em torno da filha.
Mas a mudança não veio só em termos práticos. “Eu já tinha uma noção das questões de gênero porque sempre fui muito estudiosa do movimento feminista etc. Desde a adolescência, sempre fui muito curiosa. Mas quando eu virei mãe, essa chave virou de uma forma que eu consegui compreender a complexidade de ser mãe, ser profissional, de querer fazer e produzir as coisas com as barreiras que a sociedade coloca pra gente”.
Na visão de Gabriela de Matos, a experiência de ser mãe foi como um “empurrão”. Ela exemplifica: “para criar uma criança feliz e saudável, você precisa ser também uma mulher feliz, saudável, realizada e tudo mais”.
Para ensinar sua filha a correr atrás dos próprios sonhos, Gabriela de Matos começou a conquistar os seus, servindo de exemplo. E não só a sua filha saiu ganhando, como tantas outras mulheres, por meio de suas diversas inciativas na arquitetura.
Realidade inspirou olhar para a inclusão na arquitetura
Com um bom alcance nas redes sociais e um programa de televisão, Gabriela de Matos carrega a responsabilidade de ser a primeira mulher negra a ocupar diferentes espaços.
Para ela, o Arquitetas Negras foi seu maior passo de responsabilidade. Afinal, trata-se de um projeto inédito.
Ele começou em 2018, quando morava em Governador Valadares (Minas Gerais). O projeto surgiu do incômodo que vinha da faculdade, em que ela não se sentia pertencente ao grupo.
Era uma pessoa ativa e via que em certos lugares ela tinha voz, mas em outros não. Chegou a duvidar da sua própria capacidade, um sentimento produto do racismo e do machismo.
“Depois que eu comecei a estudar cultura, o racismo enquanto um sistema, as estruturas… Eu comecei esses estudos antes de relacionar com a arquitetura”, explica.
Quando ela chegou à faculdade, conseguiu ligar os pontos e entender os motivos de não ter professoras negras ou conhecer outras arquitetas negras, por exemplo.
Daí surgiu a ideia do mapeamento para entender onde estavam as mulheres negras. Afinal, não havia ações de inclusão na arquitetura que permitissem encontrar essas profissionais. “Eu fui de uma, eu, para 300 (nomes) em uma semana”, relata.
Isso fez com que ela se identificasse e até conseguisse perceber um padrão de situações que as mulheres negras costumam passar no mercado.
Então, ela inscreveu primeiro a sua revista Arquitetas Negras em um financiamento coletivo, e o projeto foi aceito.
Foi aí que Gabriela de Matos se mudou para São Paulo. E durante as suas pesquisas, outra mudança na rota: decidiu que a produção seria um livro.
“Se fosse um livro, essas arquitetas que fossem publicadas, que tivessem interesse acadêmico, isso ia contar pontos pra elas no Lattes”, explica.
Gabriela de Matos constrói seu legado
Na última parte do podcast, Gabriela de Matos conta que recebe mensagens de diversas pessoas em suas redes sociais. Tanto de sua geração quanto de pessoas mais novas que se inspiram em seu trabalho e acreditam na inclusão na arquitetura. Mas tem uma fã especial, sua filha.
“Ela é muito fofa, ela já fala: minha mãe é uma arquiteta negra. E eu acho tão lindo ela falar isso! De certa forma eu acho que ela entende o que eu estou fazendo, na cabecinha dela, do jeito que ela consegue entender”, conta
O reconhecimento é um exemplo de como a representatividade é importante, ao ponto de uma criança conseguir perceber.
E mudando um pouco de assunto, o episódio chega ao fim com Gabriela de Matos revelando uma curiosidade. Ela é uma apaixonada por música e, por muito tempo, tocou percussão e teve uma experiência de tocar em uma bateria de escola de samba.
Tocou no carnaval, em torcida organizada em estádios de futebol, além de fazer diferentes apresentações. Certamente, um grande exemplo de profissional e de pessoa!
Além de Gabriela de Matos, outros grandes nomes já passaram pelo nosso podcast. Confira os melhores momentos do episódio com Rodrigo Ohtake!