Arquitetura slow: o valor do tempo nas construções
O movimento slow foi uma das grandes revoluções culturais das últimas décadas. Datado de 1985, tudo começou com o movimento slow food, encabeçado por Carlo Petrini, que surgiu com a ideia de promover os alimentos locais e o preparo da comida, opondo-se à extensa industrialização e ao fast food.
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A filosofia saiu do âmbito culinário, ampliando o seu questionamento central: mais rápido é sempre melhor? A industrialização impôs, ao longo dos anos, um ritmo acelerado de produção constante em diversos âmbitos da vida: na alimentação, no trabalho, na moda e na arquitetura. No caminho da velocidade, muito se perde - da conexão com o processo, à qualidade de cada etapa e o respeito às matérias-primas.
Nessa proposta de um novo olhar global para o que se produz, surge o movimento da arquitetura slow (ou lenta), também em meados dos anos 80. Na arquitetura, assim como na comida, o foco não está em fazer as coisas de forma lenta, mas sim em considerar a regionalidade, a sustentabilidade e a durabilidade das construções.
Para a arquiteta Anupama Kundoo, autora do ensaio Taking Time, que trata da arquitetura slow, a sustentabilidade está essencialmente ligada à ideia de tempo, já que “visa satisfazer as necessidades do presente sem comprometer a capacidade das gerações futuras satisfazerem as suas necessidades". Para ela, não podemos mais nos dar ao luxo de pensar a curto prazo e para o benefício de poucos. No final, a pressa só leva a mais atrasos.
Na prática, projetar levando a arquitetura lenta como pilar significa que as construções devem respeitar o entorno, misturando-se à paisagem, respeitando o meio ambiente, aproveitando ao máximo os materiais locais e considerando a função das edificações para a comunidade à sua volta. Sendo assim, a arquitetura lenta é também altamente personalizada, já que visa atender às necessidades de cada contexto.
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Mas então, projetar de forma lenta significa construir apenas casas de madeira no meio da floresta? Não mesmo! A arquitetura lenta tem evoluído dentro do ambiente urbano, levando em consideração a forma como nossas cidades se organizam hoje. Um dos grandes nomes desse mercado é o Japão - o Hillside Terrace, por exemplo, edificação em Tóquio, foi construído para que as pessoas pudessem passear entre os edifícios tendo contato com o ar livre.
Repensar a arquitetura nesse viés é projetar também para as necessidades futuras: do indivíduo que habitará o ambiente, das comunidades em seu entorno e das gerações posteriores. Os princípios fundamentais para se ter em mente na hora de aplicar a arquitetura lenta são:
Projetar para a interação com o ambiente
Já pensou como muitas das nossas construções, sejam empresariais ou residenciais, são construídas de forma a nos afastar da cidade e das pessoas em volta? Muros altos, prédios gigantescos, portarias com inúmeras restrições… tudo isso afasta as pessoas do ambiente. Por isso, na arquitetura lenta, a interação com o ambiente é levada em consideração, de forma a incentivar que as pessoas realizem trocas e conexões não apenas com quem está dentro do mesmo espaço, mas também com a comunidade e com a natureza.
Projetar para a função, antes da forma
A arquitetura lenta estimula que os profissionais considerem as pessoas primeiro, antes de projetar a aparência dos exteriores. Pensar em quem vai habitar em primeiro lugar pode ter o poder de transformar os ambientes, estimulando as características únicas de cada lugar e fugindo da ideia de construções padronizadas que seguem apenas um padrão estético estabelecido.
Projetar para a harmonia com a natureza
Repensar a forma como nossas construções modernas invadem territórios e ameaçam o equilíbrio do ecossistema é essencial. Carolyn Strauss, arquiteta, pesquisadora e fundadora do Slow Lab, resume esse princípio: “Trata-se de entender a nós mesmos como parte de sistemas maiores e mover os humanos para fora do centro das coisas”.
Projetar para priorizar o local
A sustentabilidade anda sempre de mãos dadas com o regionalismo, já que ele é capaz de reforçar valores importantes para o equilíbrio ambiental, social e econômico. Valorizar a matéria-prima e a mão de obra regional torna os ambientes mais únicos, fortalece a economia local, e diminui o impacto ambiental, graças à economia de recursos como combustível. Além disso, o uso daquilo que está disponível perto pode baratear os custos dos projetos, sendo um aliado na democratização da arquitetura.
Neste momento em que as mudanças climáticas avançam, a humanidade cresce e a necessidade de preservação se acentua, faz-se urgente que a arquitetura pratique ativamente a preservação de recursos e a construção de projetos feitos para durar. É hora de uma passagem - da demolição para a comunhão.
Falar sobre a interação com a natureza e priorizar o ser humano que vive e habita a arquitetura, é de extrema importância !! Amei a matéria !! Que mais profissionais possam pensar desta forma !!!