Arquitetura açoriana: vestígios da colonização portuguesa em SC

A arquitetura açoriana é predominante no litoral de Santa Catarina e ilustra a presença da cultura dos imigrantes que vieram para o Brasil da região das Ilhas de Açores, território pertencente à Coroa de Portugal.

A capital, Florianópolis, é a cidade que mais possui traços ainda notáveis nos dias de hoje. Neste artigo, vamos falar sobre a arquitetura açoriana: quais são suas características, onde encontrar e outros detalhes.

Confira! 

Como a cultura açoriana chegou ao Brasil?

As primeiras povoações do litoral catarinense foram fundadas pelos portugueses nos seguintes locais: 

• Nossa Senhora da Graça do Rio São Francisco (São Francisco do Sul), em 1553;
• Nossa Senhora do Desterro (Florianópolis), em 1673;
• Santo Antônio dos Anjos da Laguna (Laguna), em 1676;

Os açorianos vieram um pouco depois. A história conta que foi entre os anos de 1747 e 1753 que os primeiros saíram de sua terra natal com destino a Santa Catarina. 

A viagem pioneira percorreu 8 mil km e durou 12 dias, chegando à baía norte da Ilha de Santa Catarina em 6 de janeiro de 1748. 

Esses imigrantes — 461 pessoas no total — ficaram em quarentena por 42 dias e desembarcaram em Nossa Senhora do Desterro em 22 de fevereiro.

No total, foram cerca de 6 mil portugueses que vieram das Ilhas do Açores para construir uma nova vida na região.

No entanto, se decepcionaram, pois o clima não era favorável para instalar moinhos de trigo. Assim, seu plano inicial teve de ser abandonado.

Foi então que eles conheceram os índios e passaram a viver da plantação de mandioca e da pesca. A partir daí, começaram a construir casas e constituir famílias.  

A cultura açoriana foi predominante na região por alguns séculos e continua a ser representada fortemente na capital e em algumas outras cidades.

Sua culinária típica enriquece as opções gastronômicas do litoral catarinense com pratos feitos à base de peixes, moluscos e crustáceos.  

A tradição do artesanato pode ser notada em trançados de rede, rendas de bilro e tramoias, tapeçarias de tear e na confecção de esteiras, balaios e gaiolas. 

O folclore é representado por danças e folguedos. Os principais exemplos são a dança de pau de fita e o folguedo do boi de mamão. 

Já os traços da arquitetura açoriana podem ser vistos no casario colonial e nas igrejas católicas, que remetem à religiosidade que acompanhou o povo. 

Atualmente, as casas não são mais como as antigas, mas as que restaram foram tombadas e viraram patrimônio.

Como era a arquitetura açoriana original?

Como o Arquipélago dos Açores fica na rota das Américas e das Índias, a arquitetura açoriana sofreu fortes influências culturais de várias regiões do planeta. 

Mas claro, ela se adaptou às necessidades do povo e à geografia local. Por conta das ricas florestas, os materiais mais utilizados nas construções eram a madeira e a pedra. 

As casas contavam com piso único e paredes triangulares. Já as coberturas eram feitas de colmo ou trilhas.

As janelas eram pequenas e as portas tinham uma divisão em três compartimentos, além de serem marcadas por aberturas acima do nível da rua.  

De forma rústica e simples, as habitações visavam a proteção das famílias contra piratas e intempéries, como chuvas, ventos etc.

Como é a arquitetura açoriana em Santa Catarina?

Quando os açorianos chegaram a Nossa Senhora do Desterro, se inspiraram na arquitetura açoriana, mas incorporaram materiais próprios do litoral catarinense. 

A pedra aqui encontrada era muito pesada. Então, a madeira foi o que predominou nas construções erguidas pelo povo. 

As casas eram baixas. Por razões de segurança e economia, eram pegadas umas às outras, como geminadas. 

Com testadas pequenas e duas águas, iam se alinhando pelas ruas estreitas. Esse estilo criava um corredor contínuo de edificações bem semelhantes. 

As janelas tinham formato retangular. No lugar de vidro, era usada a madeira, com abertura para o lado de dentro da residência.  

Os ornamentos variavam de acordo com o poder aquisitivo de cada família. Quanto mais possuíam, mais enfeites, eiras e beiras as casas tinham.

As edificações eram construídas no alinhamento da rua. 

O historiador e fotógrafo Joel Pacheco passou anos estudando a arquitetura das Ilhas dos Açores e a comparou com a que hoje existe em Florianópolis. 

Segundo ele, a arquitetura açoriana catarinense reproduz muito bem o estilo luso. No entanto, conta com particularidades, incorporando características e materiais brasileiros.  

Com o passar dos anos, as casas ficaram mais confortáveis. Mesmo assim, o estilo açoriano continuou a predominar.

Algo parecido com as atuais sacadas começou a aparecer nas construções. Já a parede abaixo da janela deu espaço a um peitoril, com elementos decorativos ou falsas balaustradas. 

O concreto era um material inexistente na época. Por isso, o piso não ficava suspenso, como em uma varanda. Além disso, entre o peitoril e a esquadria havia poucos centímetros.  

No século XIX, as janelas, que antes eram simples, deram lugar aos contornos em arco, entalhes e ornamentos ao redor das esquadrias, que na maioria das vezes eram de madeira. 

Os vidros passaram a ser incorporados pelas famílias mais ricas. O fechamento era em forma de guilhotina.  

Onde encontrar a arquitetura açoriana?

A arquitetura açoriana ainda está presente em vários locais de Santa Catarina, principalmente em Florianópolis e arredores. Confira algumas construções que são herança dessa cultura portuguesa. 

Fortalezas 

Três fortalezas foram construídas para formar um triângulo defensivo na baía norte da Ilha de Santa Catarina: de Santa Cruz de Anhatomirim, de São José da Ponta Grossa e de Santo Antônio de Ratones. 

As construções tinham como objetivo prevenir o ataque de invasores espanhóis ao território catarinense. A arquitetura açoriana é expressiva nas obras, que são datadas do século XVIII. 

As fortificações têm em sua composição muralhas, pórticos, quartéis, casa de armamentos, armazém de pólvora e canhões, entre outros. 

Igreja de Nossa Senhora da Imaculada Conceição da Lagoa

Construída a partir de 1750, a Igreja de Nossa Senhora da Imaculada Conceição da Lagoa fica em um dos pontos mais privilegiados da Lagoa da Conceição.

Entre morros e mata, com uma beleza simples e charmosa, a construção religiosa carrega o estilo da arquitetura açoriana. 

O Imperador Dom Pedro II passou pela Ilha de Santa Catarina em 1861 e ficou tão feliz com a igreja que doou dois sinos que permanecem lá até hoje. 

A obra tem grande valor cultural, que lhe rendeu o ato de tombamento pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) em 1975. 

Mercado Público de Florianópolis

Os traços da arquitetura açoriana são fortes no prédio que hoje abriga o Mercado Público de Florianópolis. A obra é um marco histórico-cultural da cidade e teve origem em barracas do século XVIII.

O local foi parte importante da economia da Ilha de Santa Catarina, pois abrigou o principal ponto de comércio de peixe e outros produtos locais.  

Aliás, o Mercado Público está localizado no seio da organização econômica e administrativa da capital catarinense: o Centro Histórico.

Na região também podemos encontrar outras construções com a herança arquitetônica dos Açores, como a Catedral Metropolitana, a Praça XV de Novembro, o Palácio Cruz e Sousa e o Largo da Alfândega.   

Santo Antônio de Lisboa 

Santo Antônio de Lisboa fica no caminho que leva às praias do Norte da Ilha e faz parte do antigo núcleo de colonização açoriana. 

Aliás, na região está um dos conjuntos arquitetônicos de maior valor histórico de Florianópolis. 

No local, muitas casas de época revelam os traços da arquitetura açoriana, construídas com argamassa que misturava óleo de baleia e conchas. 

Os detalhes das obras, como os acabamentos de portas e janelas, são muito charmosos e podem ser contemplados pelos admiradores desse estilo de construção. 

Centro Histórico de São Francisco do Sul 

"São Chico", como é carinhosamente chamada, é a terceira cidade mais antiga do Brasil. Foram os tripulantes da expedição francesa de Binot Paulmier de Gonneville que pisaram pela primeira vez ali. 

Entretanto, foi o português Manoel Lourenço Andrade quem povoou a região.

Caracterizado por ruelas estreitas, o Centro Histórico de São Francisco do Sul chama a atenção por seu casario com fortes traços da arquitetura açoriana, já desgastado pelo tempo.

Entre as construções, destaca-se a Igreja Matriz Santuário Nossa Senhora da Graça, que é considerada um cartão-postal da cidade.  

As mais de 150 edificações da região foram tombadas Patrimônio Histórico Nacional e têm como quintal a Baía da Babitonga. 

Como levar a arquitetura açoriana para projetos contemporâneos?

Atualmente, a arquitetura busca dar um toque pessoal aos projetos, mas sem abrir mão de beleza e funcionalidade.

Para usar a arquitetura açoriana como inspiração, é possível misturar elementos antigos e novos, criando formas únicas de expressão. 

Você pode começar com uma paleta de cores com base branca, que deve ser complementada com tons de amarelo, azul e/ou vermelho.

Revestimentos que reproduzem os tradicionais azulejos portugueses são bem-vindos nesse tipo de projeto.

Apostar em fibras e texturas naturais é uma estratégia para deixar a decoração mais rústica e aconchegante.

Por fim, decore com elementos que remetam à cultura açoriana, como renda de bilro, redes, tapeçarias, esteiras, balaios, gaiolas etc.

Peças de artesanato que representam as casas, as danças e os folguedos típicos também são boas pedidas.

Gostou de conhecer a arquitetura açoriana? Para conferir outros estilos, aproveite para acessar o artigo Arquitetura inca: monumentos com a mais alta expressão artística!

Em destaque, o quartel do comandante, na Fortaleza de Santa Cruz de Anhatomirim (Foto: Mariahaversa)