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Projeto para centro de parto humanizado em Porto Alegre - RS (Crédito: Yapo)

Bioconstrução na arquitetura

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23.03.2022
Como tecnologias de bioconstrução na arquitetura em simbiose com a natureza criam projetos com menor impacto ambiental significativo.
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Você já parou para pensar na "roupa" que a sua casa veste? O papo parece coisa de louco, mas se você for além, vai perceber que há muita coisa por trás dos alicerces que sustentam uma moradia. 

Para ouvir o artigo completo, clique no play abaixo:

Tomando contextos cada vez mais globais, a sustentabilidade ganha campo na arquitetura e urbanismo a passos largos. As cidades assumem, nessa perspectiva, forma de ecossistema, que se interligam a outros mecanismos e criam uma situação de interdependência. Espaços mais frescos, verdes, permeáveis e comestíveis. Seria um sonho, né? Mas algumas técnicas de construção já estão fazendo a diferença por aí e podem ser o seu portal de acesso à tão sonhada qualidade de vida. 

matérias primas bioconstrução
Atividade de biomaquetes presente na oficina de bioarquitetura e bioconstrução na arquitetura do coletivo Yapó (Foto: Coletivo Yapó)

A bioconstrução na arquitetura é uma delas. Um artigo divulgado pelo Instituto UNIEMP a define como uma técnica de construção cujo principal objetivo é reunir tecnologias milenares e inovadoras para garantir a sustentabilidade em todo o processo de construção, passando pela execução, ocupação e convivência. Uma contrapartida à construção civil, um dos setores que mais gera impactos negativos para o planeta. 

Basta voltar um pouco no tempo para perceber que nossos antepassados eram bioconstrutores natos, sempre atentos aos sinais da natureza. Foi esse alento que levou o coletivo Yapó, que quer dizer “barro” em Mbya Guarani, a resgatar formas saudáveis de habitar a terra. Há mais de dois anos, a Daniela Tatsch Baptista, arquiteta e urbanista, o Kleber Colombo, engenheiro civil,  a Bruna Tabajara e o Brilmann e Francisco Lang, ambos arquitetos, se juntaram para formar um escritório de bioarquitetura e engenharia consciente, que já percorreu três estados do sul do país com projetos variados: casas mínimas (tiny houses), sítios/chácaras e institutos de educação.

casa bioconstrução com madeiras locais
Casa no processo de construção, feita com árvores locais (Foto: Coletivo Yapó)

Para eles, a bioconstrução na arquitetura vai além de um produto, é um estilo de vida que compila saberes ancestrais - assim como a permacultura, que valoriza cada recurso da melhor forma possível - ao olhar cuidadoso na hora de fazer escolhas.  

"Buscamos trazer a sensibilização sobre o que acontece no planeta a partir de nossas escolhas. De onde vem os materiais que escolhemos? O que acontece com a Terra em função de nossas escolhas, normalmente está bem longe dos olhos de quem compra", afirma Daniela. 

Se olharmos ao nosso redor, a ideia de natureza como abrigo é algo distante da vivência urbana, muitas vezes pelo distanciamento que nós - humanos - temos em se considerar parte da natureza. E se também somos natureza, é nosso dever utilizar esses recursos para promover o equilíbrio em toda a sua biodiversidade. Isso faz da bioconstrução na arquitetura uma prática sobre observar o que o local tem a oferecer, mais do que impor algo a ele. 

Quando a gente se atende à "roupa" que uma casa está vestindo, segundo Kleber, ela precisa estar de acordo com o clima e todo ambiente que está inserida. E ao contrário do que as tendências ditam, a roupa perfeita pode estar no barro, na palha, na areia ou onde menos se espera. 

"Assim também deveria ser com a forma que a gente se veste. Porque senão, ou ficamos desconfortáveis, e podemos até nos acostumarmos ou nos alienamos desse desconforto, ou iremos gastar muito com eletricidade, ou combustão de madeira ou gás, para nos sentirmos bem. E o preço que pagamos por isso costuma ser mais alto do que a quantia que pagamos diretamente em dinheiro", comenta Kleber. 

bioconstrução em equipe
Mutirão de bioconstrução da escola autônoma Mbya Guarani Tekó Jeapó (Foto: Coletivo Yapó)

Mas o que norteia um projeto de bioconstrução na arquitetura?

  • Preservar o máximo da vegetação natural do entorno;
  • Matéria prima de fonte renovável e confiável (não utiliza madeira de áreas desmatadas, por exemplo);
  • O projeto é visto como um organismo vivo, tudo é levado em conta: a posição do sol, vento, vegetação, clima;
  • Preocupação em cada escolha, como fornecedores locais, trabalho justo, matéria prima renovável;  
  • Energia limpa ou renovável; 
  • Ventilação e iluminação natural; 
  • Saneamento ecológico; 
  • Uso de composteira; 
  • Banheiro ecológico e outros. 
mutirão telhado verde
Mutirão de telhado verde executado entre mulheres (Daniela na escada) (Foto: Coletivo Yapó)

E quanto custa ter uma casa bioconstruída? 

Os valores mudam muito de acordo com a região, mão de obra e matéria prima. Há relatos de que com 8 mil reais é possível construir uma casa a base de COB, uma mistura de argila, areia e palha de custo quase nulo, à prova de fogo e altamente a abalos sísmicos, que seria a base da bioconstrução. 

Porém tudo pode variar dependendo da metragem e outros quesitos que já mencionamos. Vale consultar uma construtora especializada para fazer um orçamento. O fato é que a bioconstrução é indiscutivelmente mais acessível financeiramente do que os métodos tradicionais. 

Quer saber mais? Então dá um confere no papo que rolou com a Daniela e o Kleber. 

M1L: Nos conta um pouco da sua trajetória com a bioconstrução?

Daniela: A bioconstrução para nós, Kleber, Bruna, Chico e eu, surgiu de diferentes maneiras, mas como um movimento à parte da educação acadêmica formal. Foi uma caminho alternativo que apresentou-se de forma sistêmica, e que nos fez sentido, pois a arquitetura que atualmente é vista como convencional, nem sempre faz sentido. Ela extrapola as necessidades por recursos naturais e gera muitos resíduos. 

Kleber: Chegamos nesse universo alternativo participando, de forma voluntária, de mutirões, cursos e eventos sobre o tema. Um exemplo em comum para a gente foram os mutirões de bioconstrução de uma escola autônoma indígena, que ocorreu num processo de retomada do território ancestral da comunidade Mbya Guarani. Esse movimento apoiou uma busca pessoal em cada um (e uma) de nós, na procura por formas de mudar nossas escolhas neste planeta, inclusive no modo de construir e se abrigar. E também retomou e fortaleceu o hábito de construir pelos indígenas de lá.

M1L: Como e por que tecnologias em simbiose com a natureza podem proporcionar

projetos mais integrados, mais sustentáveis e de menor impacto ambiental?

Daniela: Existem muitas estratégias que consideramos uma a uma, a cada projeto, como: a geração de energia limpa; o cuidado com o desenho bioclimático, que favorece ventilações naturais na edificação, minimizando a necessidade de ar condicionado, por exemplo; o tipo e o dimensionamento ideal de saneamento ecológico, que age em prol do adequado manejo das águas servidas; o uso de composteiras; o fomento à própria produção de alimentos e a importância da iluminação natural dentro dos ambientes. 

A ideia é que os custos de implementação destes serviços sejam mais baixos do que o seu uso, ao longo de todo o tempo de vida da edificação. E que ainda promovam a preservação.

Kleber: A diferença desta prática que promove a saúde na hora de projetar e construir, em comparação a uma prática convencional, é que essa exerce o olhar atento para o entorno da construção, observando condicionantes externos (como insolação, ventos, sombras, vistas), possíveis materiais locais (preferencialmente naturais), saberes locais de mão de obra e as necessidades de quem habitará o lugar. A bioarquitetura considera um sistema holístico, onde a edificação integra-se na paisagem local sem grandes impactos visuais e ambientais. 

M1L: Como você vê o futuro da bioconstrução em relação a modelos de construções tradicionais? Há mercado para ela?

Daniela: Vemos que embora as pessoas estejam buscando por isso, ainda há resistência no processo de formação profissional, que pouco trata desses assuntos dentro da academia. Há mercado, porque cada vez mais as pessoas se conectam com processos de despertar. Às vezes a gente, como ser humano, se distrai apontando erros nas pessoas, sem olhar para o que nós precisamos e podemos mudar. E isso envolve o olhar. É com o olhar para dentro que a gente pode mudar e colaborar. E é sobre isso o despertar. A bioconstrução foi fortemente exercida por nossas gerações passadas, avós e bisavós, que viviam comumente em casas de materiais e saberes locais, do tamanho que precisavam.

Kleber: O futuro é muito promissor, pensando que o número de pessoas que chega até a bioarquitetura e a bioconstrução não para de aumentar. O período de pandemia aumentou o interesse por práticas construtivas que promovam saúde e nada mais fácil do que procurar a palavra: BIOCONSTRUÇÃO no google ou nas redes sociais. O número de cursos online, vídeo aulas e podcasts também aumentou. Então, enquanto as pessoas mais exercerem essas práticas construtivas saudáveis, e menos favorecerem os impactantes hábitos vistos como comuns nas cidades, atualmente, melhor será esse futuro. Eu acredito e tenho fé na humanidade, que podemos reverter o quadro atual, passo a passo.

Quer saber mais sobre o Yapo? Acesse aqui


Por Mila Benvegnú - @milabenvegnu 

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