26.02.2018
Avaliação 
Avalie
 
Sem votos
Avaliar

Projeto, pesquisa, propósito

 minutos de leitura
calendar-blank-line
26.02.2018
Usando tecnologias digitais acessíveis para a criação de seus produtos, e feiras especializadas e comércio on-line para acessar potenciais consumidores, designers independentes despontam no mercado e provam que novas e boas ideias nem sempre dependem de altos investimentos.
minutos de leitura

Se for possível apontar uma tendência do design de produtos no Brasil, arriscaria dizer que ela está intrinsecamente ligada à produção em pequena escala e à facilidade com que hoje designers acessam potenciais consumidores. Feiras como a MADE, em São Paulo, ou plataformas de comércio on-line como o Boobam, que reúnem criadores de todo o Brasil, comprovam que o design independente está em alta.

Há lados negativos e positivos nessa constatação. Talvez exista uma discrepância entre o número de egressos de escolas de design e de arquitetura e a capacidade – ou disposição – do mercado formal brasileiro absorver sua expertise. O design tem o poder de instigar a reestruturação completa de uma empresa, e por isso é uma cultura que não se instala da noite para o dia. A falta de designers em indústrias é desfavorável também porque é a indústria que em geral dispõe dos meios materiais e tecnológicos que propiciam inovação, uma força potencial que os designers são treinados para despertar.

A arquiteta Andrea Macruz, do Nolii, transpõe parâmetros encontrados na natureza para os desenhos de suas peças, por meio de programas computacionais avançados como o Rhino e o Grasshopper. As estruturas também se baseiam em técnicas tradicionais, como o origami e o kirigami japoneses. A arandela f.os, criada por desenho paramétrico, é impressa em 3D pela Shapeways, em Nova York. Foto: Flávio Sampaio.
A arquiteta Andrea Macruz, do Nolii, transpõe parâmetros encontrados na natureza para os desenhos de suas peças, por meio de programas computacionais avançados como o Rhino e o Grasshopper. As estruturas também se baseiam em técnicas tradicionais, como o origami e o kirigami japoneses. A arandela f.os, criada por desenho paramétrico, é impressa em 3D pela Shapeways, em Nova York. Foto: Flávio Sampaio.

Mas novas e boas ideias não dependem sempre de altos investimentos: muitos designers vêm inovando com o uso de tecnologias digitais acessíveis ou lançando mão de técnicas antigas. Além disso, ao se trabalhar com pequenos fornecedores, aqueles “do bairro” – marceneiro, serralheiro, vidraceiro, empalhador – fomentam-se conhecimentos cada vez mais extintos. A liberdade de estar desconectado das exigências de uma empresa também abre brechas para testar ideias (aqui é preciso fazer uma ressalva: nem todo experimento gera resultados que podem ser imediatamente traduzidos em produtos!). Por fim, é sempre benéfica a proximidade entre quem cria e quem consome. No Boobam, por exemplo, o designer tem contato direto com o seu público, que pode, em muitos casos, solicitar produtos sob medida, e avaliar aquilo que adquire.

Os tipos de materiais, ferramentas e técnicas disponíveis para designers brasileiros também aumentaram consideravelmente nas últimas duas décadas. Se antes predominava, no móvel feito em pequenas quantidades e artesanalmente, o uso da madeira, do couro, de metais tradicionais como ferro e latão, e de alguns tipos de pedras, hoje é possível optar por matérias-primas mais elaboradas, como o aço carbono ou compostos sintéticos a exemplo do Corian; tecnologias de corte computadorizado por máquinas CNC laser ou routers; acabamentos protetores como a galvanização, a anodização e a pintura eletrostática. Há ainda os materiais naturais redescobertos ou que ganharam mais adeptos, como cortiça, fibras e argilas, novos tipos de concreto, além do infinito leque de materiais deslocados de seu uso original para o design, na tradição dos irmãos Campana.

Possibilidades não faltam – mas não bastam. Criar coisas significativas em um mundo já tão superpopulado por coisas não é tarefa fácil. Design é um exercício impulsionado por desafios e contido por limitações. Deve responder a um problema, a uma investigação, e ter como base boas perguntas. Acredito ser essa uma das principais fórmulas para um produto bom e longevo. Reside aí uma grande desvantagem para o designer independente: ele muitas vezes trabalha sem uma demanda. Contornar adversidades é um impulso para criar projetos menos gratuitos. Sobretudo para não cair na armadilha, em tempos midiáticos, de criar apenas uma mera imagem de impacto.

Interessado em investigar propriedades que aproximam o usuário da madeira, o Atelier Mobu criou o e = MC³, uma versão original de um barril de envelhecimento de cachaça. Em forma de infusor, a tampa porosas de madeira provoca por meio da troca com o ar reações químicas no líquido, um processo cujo tempo é controlado pelo usuário; “a garrafa de vidro transparente permite que o consumidor aprecie as mudanças do destilado conforme o tempo passar”. Cada espécie utilizada, como carvalho e jequitibá, gera uma coloração, aroma e sabor. Foto: Divulgação.
Interessado em investigar propriedades que aproximam o usuário da madeira, o Atelier Mobu criou o e = MC³, uma versão original de um barril de envelhecimento de cachaça. Em forma de infusor, a tampa porosas de madeira provoca por meio da troca com o ar reações químicas no líquido, um processo cujo tempo é controlado pelo usuário; “a garrafa de vidro transparente permite que o consumidor aprecie as mudanças do destilado conforme o tempo passar”. Cada espécie utilizada, como carvalho e jequitibá, gera uma coloração, aroma e sabor. Foto: Divulgação.

Há muita coisa interessante para usar, olhar e ter. Antes de adquirir uma peça, sugiro que pergunte: gosto das outras criações desse designer? Há um sentido que conecta o conjunto de seu trabalho? Os materiais estão sendo explorados de maneira que não poderiam ser substituídos por outros? Essas são boas maneiras de identificar se existe intenção, pesquisa e a construção de uma linguagem coesa por trás de algo singular que atraiu sua atenção.

Luminárias produzidas com materiais finos e muito bem acabados são a tônica do trabalho de Bianca Barbato. Nas luminárias pendentes Cabaça e Gramofone, ela utiliza a resina moldada, com um nível de acabamento que poderia ser comparado ao de um cristal. Fotos: Frâncio de Hollanda e Ali Karakas.
Luminárias produzidas com materiais finos e muito bem acabados são a tônica do trabalho de Bianca Barbato. Nas luminárias pendentes Cabaça e Gramofone, ela utiliza a resina moldada, com um nível de acabamento que poderia ser comparado ao de um cristal. Fotos: Frâncio de Hollanda e Ali Karakas.
Compartilhe
Avaliação 
Avalie
 
Sem votos
VOLTAR
ESC PARA FECHAR
Minha avaliação desse conteúdo é
0 de 5
 

Projeto, pesquisa, propósito...

Projeto, pesquisa, propósito

  Sem votos
minutos de leitura
Em análise Seu comentário passará por moderação.
Você avaliou essa matéria com 1 estrela
Você avaliou essa matéria com 2 estrelas
Você avaliou essa matéria com 3 estrelas
Você avaliou essa matéria com 4 estrelas
Você avaliou essa matéria com 5 estrelas

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Livia Debbané
Colunista
Colunista

Jornalista especializada em design. É graduada em Filosofia pela PUC-SP. Trabalhou na revista Bamboo...

Conhecer artigos



Não perca nenhuma novidade!

Assine nossa newsletter para ficar por dentro das novidades de arquitetura e design no Brasil e no mundo.

    O Archtrends Portobello é a mais importante fonte de referências e tendências em arquitetura e design com foco em revestimentos.

    ® 2024- Archtrends Portobello

    Conheça a Política de Privacidade

    Entenda os Termos de Uso

    Veja as Preferências de Cookies