Em teoria, existem 6.9 bilhões de toneladas de plásticos esperando um destino mais digno do que degenerar, lentamente, sob e sobre a terra, nas águas de rios, lagos, mares e oceanos. Se designers são caçadores de bons problemas, a presa está acenando e pedindo socorro.
Os bilhões de toneladas representam, estima-se, 75% do total de plásticos sintéticos produzidos desde que a invenção foi feita em laboratório, em meados do século 19. Isso significa que apenas um quarto de tudo o que outrora nos foi útil já não o é mais e virou lixo.
Plásticos são objeto de uma contradição espantosa: podem materializar coisas que alcançariam tranquilamente os 450 anos de vida – seu tempo médio de decomposição – e, no entanto, dão forma a coisas cuja vida útil é de alguns minutos. Quarenta por cento do plástico produzido hoje no mundo, na forma de embalagens e utensílios, é descartado em menos de meia hora.
O plástico vive um ciclo vicioso. Descartável porque barato, barato porque descartável. O crescimento de sua produção tornou-se exponencial a partir da Segunda Guerra, para substituir vários tipos de materiais naturais então escassos. Desenvolvidas as tecnologias que permitiram o barateamento da produção, o plástico nunca mais seria tratado como a nobre invenção que nos permitiu deixar de usar marfim em teclas de piano ou cascos de tartaruga em armações de óculos. Tornou-se o símbolo perverso do conforto preconizado pelo “american way of life”. Em junho, a revista National Geographic fez um especial sobre o tema, focando principalmente a poluição dos oceanos, e publicou uma foto aterrorizante para os dias atuais. Na imagem, feita em 1955 pela revista Life, uma família joga para o alto, aos risos, copos, pratos e talheres descartáveis, numa espécie de celebração da vida prática.
O design que criou ícones de funcionalidade como as cadeiras monobloco de Vico Magistretti, Verner Panton e, mais recentemente, Philippe Starck ou Jasper Morrison deve tomar à frente do problema. É urgente refletir: se teremos que conviver com as tais sete bilhões de toneladas por ao menos mais três séculos, melhor transformá-las a nosso favor e, de quebra, remediar um grande desastre ambiental.
Algumas iniciativas recentes apontam caminhos possíveis.
Como recolher?
Para Boyan Slat, que aos 17 anos fundou a ONG Ocean Clean Up, problemas complexos pedem soluções ambiciosas. Sem dar bola para análises pessimistas sobre seu projeto, que pretende em algumas décadas limpar boa parte dos oceanos, o jovem empreendedor vem, há seis anos, arrecadando fundos e coordenando uma equipe multidisciplinar para construir um inovador sistema de limpeza.
A ideia se apoia no movimento das correntes marítimas responsáveis por formar gigantescas zonas de acúmulo de lixo pelos mares – a maior delas chama-se, em inglês, Great Pacific Patch e se situa ao norte do Havaí. Em vez de tentar caçar o plástico espalhado pelos mares, Slat concluiu que seria mais eficiente criar barreiras que aceleram o processo natural de acúmulo. Por meio de contrapesos, enormes boias em forma de U navegam a uma velocidade um pouco inferior à das correntes e, portanto, do lixo, fazendo com que esse se aglomere no centro da estrutura, o que facilita seu recolhimento. Em abril, o primeiro teste foi levado até o foco no Pacífico, no qual navegam 1.8 trilhão de pedaços plásticos. Até o fim de 2018, essa primeira estrutura trará de volta a terra cinco toneladas de detritos. A ideia é que o dinheiro advindo da venda para a reciclagem continue a financiar o projeto.
Como reciclar?
Problema global, solução local. O designer holandês Dave Hakkens sonhou estabelecer ao redor do mundo pequenos centros de reciclagem de plástico. Por meio do site preciousplastic.com, Hakkens disponibiliza plantas open source das máquinas que desenvolveu. Construídas de um jeito fácil e com materiais acessíveis, elas admitem pequenas alterações para se adaptarem a diferentes realidades. No centro, é possível triturar o material recolhido e transformá-lo por meio de três tecnologias: extrusão, injeção e compressão. No total, são quatro aparelhos.
Hakkens criou também uma série de ferramentas on-line para cooptar pessoas a aderirem ao projeto. Além de tutoriais de como construir as máquinas, há exemplos de objetos que podem ser feitos e uma loja on-line para reunir os produtores. O Precious Plastic é uma oportunidade de limpar a vizinhança e ainda começar um novo negócio. Quatro anos depois do lançamento do projeto, ele já foi adotado por 200 designers.
O que produzir?
A curadora Rossana Orlandi, à frente da renomada galeria de mesmo nome, lançou na última semana de design de Milão a iniciativa Guiltless Plastic (“plástico sem culpa”). Seu objetivo é reverter a percepção sombria do material e mostrar a criatividade que o processo de reciclagem pode permitir. Além de uma série de palestras, o espaço apresentou dois novos produtos feitos com plástico reciclado: uma cadeira transparente impressa em 3D, do designer holandês Dirk Vander Kooij, e uma espreguiçadeira multicolorida do italiano Alessando Mendini, criada para a empresa alemã Ecopixel.
Em teoria, tudo que seria feito com um plástico novo pode ser feito com o reciclado. Ainda faltam tecnologias para que esse alcance as qualidades estéticas, de performance e de custo do material produzido do zero. Até chegarmos a esse ponto, há muitas brechas a serem preenchidas por designers.