Lugares distintos afetam pessoas de maneiras diferentes. A experiência que a gente tem numa cidade em determinado momento da vida é algo absolutamente pessoal e intransferível. Onde nascemos, a forma como fomos criados, tudo aquilo que nos despertou curiosidade até hoje e nossa sede de crescimento transformam o tipo de aprendizado que a gente absorve quando colocamos o pé fora de casa.
Cada viajante nota um detalhe diferente, se emociona com um gesto peculiar e se inspira com uma paisagem distinta. Talvez por essas e outras, eu tenha ficado tão feliz quando soube que participaria do meu primeiro Coletivo Criativo.
Já há alguns anos, a Portobello promove uma jornada para um destino escolhido a dedo, com um grupo de vinte e poucos arquitetos. A escolha dos profissionais leva em consideração as relações com a marca e com os clientes, o espírito de parceria, a curiosidade nata de cada explorador e a disponibilidade na agenda de cada indivíduo, é claro.
A paixão da Portobello pelo ato de buscar inspiração em diferentes culturas, não é novidade. Durante anos a marca elaborou grandes viagens nacionais e internacionais com o intuito de levar profissionais interessados em arquitetura, decoração e paisagismo para uma mesma cidade. A empreitada deu tão certo que, três anos atrás, a iniciativa tomou uma proporção ainda maior: a viagem deve inspirar na cocriação de um produto, inspirado por este grupo após alguns dias em um destino específico.
Em 2017, os arquitetos foram a Copenhagen, uma verdadeira meca do design. Influenciado pelo minimalismo dinamarquês, o time elaborou a linha Dansk. Ano passado foi a vez de Reykjavik, um local relativamente ermo com paisagens singulares, solo nada fértil, montanhas rochosas e tons muito característicos. A partir dessa experiência foi criada a linha Harpa – uma coleção que remete aos vulcões islandeses e às montanhas rochosas do país.
Este ano, fomos a Berlim. Poucos países têm uma história tão atrelada ao que há de pior - e melhor - na natureza humana quanto a Alemanha. Diferente de muitos lugares, esta nação se recusa a esquecer os próprios erros. Por toda parte há monumentos, estátuas, memoriais e construções que nos recordam as atrocidades do nazismo, da Segunda Guerra Mundial e a segregação proporcionada pelo Muro de Berlim. Estas obras nada mais são que lembranças para que flagelos como esses nunca mais aconteçam. Os alemães não podem apagar o passado, mas tentam constantemente aprimorar o futuro. Essa atitude afeta tudo na vida deles, desde a maneira como decidiram acolher mais de um milhão de refugiados sírios no ano passado até a falta de apego pelo capitalismo. Para eles, liberdade vale muito mais que dinheiro.
Exatamente por este destino não oferecer respostas fáceis, a tarefa de criar uma coleção baseada em Berlim acaba sendo um grande desafio.
Já estive na Alemanha algumas vezes – inclusive uma delas gravando meu programa Pedro Pelo Mundo – no entanto, nesses dias que passei na metrópole com o grupo do Coletivo Criativo Portobello, fiquei realmente intrigado com o que cada um considerava inspirador. Enquanto uma pessoa observava as construções brutalistas, outra se apegava ao simbolismo do Museu Judaico. Enquanto um se apaixonava pelos parques (Berlim é uma das grandes cidades mais arborizadas da Europa), o outro questionava as cores usadas em prédios imaginados nos anos dourados da Bauhaus (a escola de arte vanguardista mais popular da história).
Apesar de tudo isso ser fascinante, aos meus olhos, a grande lição estava na sinergia entre os profissionais e na maneira como mais de vinte olhares analisariam de forma coerente uma mesma experiência.
A Portobello deixa claro que os frutos dessa iniciativa demandam algumas etapas até serem materializados. A viagem em si é apenas o início de um processo de parceria que dura alguns meses até que as decisões sejam efetivamente tomadas. Nesses primeiros dias longe de casa, o objetivo é entender o povo local, questionar as escolhas de quem vive naquele lugar e contemplar o tipo de sentimento que o destino causa em cada um. Com esses ingredientes em mãos, o diálogo começa a tomar forma.
Sempre digo que quando o assunto é viajar, ouvir é infinitamente mais importante que falar. O Coletivo Criativo é uma atividade importante exatamente por exigir hábitos preciosos como o debate, a observação, o estudo, a habilidade de contemplar algo ainda não compreendido e a arte de concretizar uma experiência emocional.
Meus dias em Berlim com a Portobello me mostraram que o Coletivo Criativo traduz várias jornadas em uma – uma física, uma intelectual, uma emocional e, no frigir dos ovos, um grande projeto de vida prestes a ser traduzido fisicamente em uma linha, uma produção comercial que estará revestindo vários lugares pelo mundo.
Andy Warhol dizia que o objetivo não é viver para sempre, mas sim, criar algo que viva. Ele estava certo.