Embora não tenha nascido no Brasil, Joaquim Tenreiro pode ser considerado o pai do design de móveis brasileiro do século XX, graças à precisão inigualável e aos detalhes impecáveis, com criações que transformaram drasticamente a indústria moveleira nacional.
É verdade que ele sempre se considerou mais um escultor que um designer de móveis. Talvez seja por isso que as suas peças sejam tão diferentes de obras contemporâneas. Quer conhecer esse grande mestre? Siga conosco!
A história de Joaquim Tenreiro
Joaquim Tenreiro nasceu no ano de 1906 em Portugal. No entanto, quando ele tinha dois anos a sua família imigrou para o Brasil, fixando residência em Niterói. Em 1914, retornaria ao seu país natal para iniciar aulas de pintura.
Filho de marceneiros, durante todo o período entre Brasil e Portugal Tenreiro ajudou seu pai na produção de móveis, tomando o primeiro contato com a área.
Entre 1925 e 1927, ele decidiu retornar de vez para o Brasil. No ano de 1928, fixou residência definitiva no Rio de Janeiro, frequentando, então, o curso de desenho do Liceu Literário Português e fazendo cursos no Liceu de Artes e Ofícios.
Em 1931, Tenreiro passou a integrar o Núcleo Bernadelli, grupo criado em oposição ao ensino acadêmico da Escola Nacional de Belas Artes (Enba). A partir da década de 1940, ele se dedicou à pintura de retrato e paisagem de natureza morta.
Os primeiros passos como designer de móveis
Os primeiros passos de Joaquim Tenreiro no design de móveis tiveram início em 1933, quando começou a trabalhar na empresa Laubisch-Hirth, especializada em mobiliário nos estilos francês, italiano e português.
Posição que manteve até 1943, quando ele decidiu, então, montar sua primeira oficina, a Langenbach & Tenreiro.
Alguns anos mais tarde, Tenreiro inaugurou as suas lojas de móveis, primeiro no Rio de Janeiro e depois em São Paulo. Ao criar sua própria empresa, ele começou a colocar em prática suas ideias para o mobiliário moderno.
Porém, antes disso, já era um nome conhecido no cenário do design de móveis brasileiros. Tenreiro recebeu sua primeira encomenda para a residência de Francisco Inácio Peixoto, no interior de Minas Gerais, projetada por Oscar Niemeyer.
Esses são os primeiros exemplares da produção dele que se distinguem pela sobriedade das formas e pelo uso sábio das madeiras nacionais, ao mesmo tempo em que dialogam com a pureza dos traços de Niemeyer.
Durante as décadas de 1950 e 1960, Tenreiro desenhou mobiliários e painéis em madeira, acompanhando o progresso da arquitetura moderna brasileira, com seus móveis presentes em inúmeras instituições no país, com destaque para o Itamaraty e o Senai.
Apesar da produção aclamada, ele decidiu interromper sua carreira de sucesso no mundo do mobiliário e, por isso, seus móveis ganharam status de raridade e obra de arte. Sem contar, é claro, a qualidade técnica e o fator inovação.
A vida nas artes plásticas
No final da década de 1960, Joaquim Tenreiro pôs fim às suas atividades de criação e fabricação de móveis. Então, dedicou-se por mais de 20 anos às artes plásticas, especialmente à escultura.
Produziu treliças, relevos e colunas em madeira policromada, com destaque para as peças que combinavam arte e o amplo conhecimento adquirido como designer de móveis. Algumas das soluções criadas por ele para seus mobiliários foram usadas de maneira mais livre em suas esculturas.
Assim, a produção de Tenreiro no campo das esculturas aliou características modernas com o despojamento e a simplicidade do uso de materiais tipicamente brasileiros. É exatamente isso que assegura que as suas peças tenham qualidade artística.
Em 1969, ele fez um painel para a Sinagoga Templo Sidon e, mais tarde, a portada da Capela Ecumênica da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UFRJ). Em 1975, realizou dois painéis em fibra de vidro, cada um medindo 8x6 m, para o novo auditório do Senai, na Tijuca. Em 1978, foi escolhido como o Melhor Escultor do Ano pela Associação Paulista de Críticos de Arte (APCA).
Sua carreira como pintor também não deve nunca ser esquecida. Tenreiro continuou pintando em intervalos até 1960 e depois de forma mais intensa.
Em 1960, ele recebeu uma menção honrosa em desenho no Salão Nacional de Arte Moderna. Em 1965, participou da VIII Bienal de São Paulo, com relevos tacheados e óleos sobre neoplan da série Ciclistas, tema recorrente em sua produção.
Tenreiro faleceu em 1992, na cidade de Itapira, no interior de São Paulo, após uma carreira prolífica tanto no design de móveis quanto nas artes plásticas, sobretudo na escultura e na pintura.
As principais obras e revolução no setor moveleiro
São muitas as criações de Joaquim Tenreiro que trazem o modernismo ao setor moveleiro nacional. Separamos algumas delas para você conferir.
Poltrona Leve
É uma das peças mais famosas de Joaquim Tenreiro. Criada em 1942, a Poltrona Leve foi confeccionada em madeira marfim, com versão escura em imbuia, e estofada com tecido estampado por Fayga Ostrower.
A cadeira foi concebida a partir do princípio desenvolvido por Tenreiro de que o mobiliário brasileiro precisa ser leve. Para o designer, leveza não tem nenhuma relação com o peso em si, mas sim com graça e funcionalidade.
Seguindo as tendências modernistas da época, os móveis dele estavam alicerçados no princípio de se retirar o que era desnecessário, demonstrando, assim, a verdadeira beleza de um objeto e mantendo sua função.
Embora tenha sido criada em 1942, a Poltrona Leve foi reeditada várias vezes nas décadas seguintes e chegou a estampar a primeira capa da revista AD, em 1953. Em 1960, foi recriada em ferro, com apoios para os braços em madeira escura.
Os pés finos e os braços levemente curvados foram alvo de muitas cópias de marceneiros e grandes lojas de móveis.
Cadeira de Três Pernas
Sem dúvida, essa é uma das principais criações de Joaquim Tenreiro, produzida em 1947 e aclamada em todo o mundo. Nela, o designer associou geometria e cor, usando de maneira muito particular as madeiras brasileiras.
A cadeira é composta por uma mistura de madeiras — roxinho, imbuia, jacarandá, cabreúva e marfim — com tonalidades variadas, de um modo cromaticamente inovador.
À época, Tenreiro explicou as dificuldades técnicas para criar a cadeira, pois ela combina madeiras que retêm diferentes níveis de umidade, secam em taxas variadas e se expandem e se encolhem de maneira distinta.
Mas o sucesso do seu projeto fala por si só.
Da mesma forma que os outros produtos criados por ele nesse período, a Cadeira de Três Pernas tem um aspecto leve e luminoso, que contrasta com os móveis sóbrios e sólidos que o designer criou anteriormente para a Laubisch-Hirth.
O móvel ganhou ainda mais importância ao ser exposto no Salão de Arte Moderna do Rio de Janeiro.
Cadeira Estrutural
A tecelagem de materiais naturais, como a palha, também foi explorada em algumas cadeiras e poltronas de Joaquim Tenreiro, evocando trançados e cestarias indígenas.
O uso da madeira e das fibras naturais está geralmente associado à necessidade de adaptar os móveis ao nosso clima tropical.
Ao lado dessas composições orgânicas, Tenreiro criou outras peças, com a presença de formas geométricas, como a Cadeira Estrutural.
Apesar da resistência dele em produzir móveis em série, ele foi responsável por criar produtos esteticamente modernos e levar ao interior das casas brasileiras entre as décadas de 1940 e 1960 um novo estilo de design, que já predominava na Europa desde os anos 20.
Como podemos notar, Joaquim Tenreiro foi um artista plural, com criações em diferentes áreas das artes e a inserção de diversos materiais em uma mesma peça, com detalhes projetivos que conferem, ao mesmo tempo, leveza, textura e organicidade.
Mesmo sem produzir de forma industrializada, o designer entrou para a história do mobiliário brasileiro como o “pai” do móvel moderno no país, com peças que introduziram a estética modernista do século XX e tinham o diferencial de contar com uma linguagem tipicamente nacional.
Gostou de conhecer Joaquim Tenreiro? Então, aproveite para conferir nosso conteúdo sobre Guilherme Wentz, um dos mais promissores designers de móveis da nova geração brasileira!
Foto de destaque: Embora não tenha nascido no Brasil, Joaquim Tenreiro é considerado o pai do design brasileiro de móveis do século XX (Foto: Joaquim Tenreiro Institute)