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Florianópolis poderá se tornar a primeira cidade no Brasil a ter uma espécie de “código de energia” para as edificações, ou seja, uma política pública que busca aumentar a eficiência energética das edificações na cidade. Isso será viável a partir da adoção das diretrizes propostas no documento “Eficiência Energética como Política Pública para Edificações”, resultado da segunda etapa do Projeto Cidades Eficientes, que escolheu a capital de Santa Catarina para dar continuidade ao projeto iniciado em 2018. O texto será entregue à Prefeitura no final de junho, junto com o Manual de Compras Públicas Eficientes, também redigido pela equipe de especialistas do projeto, que é realizado pelo Conselho Brasileiro de Construção Sustentável (CBCS), com financiamento do Instituto Clima e Sociedade (iCS) e parceria da Prefeitura Municipal de Florianópolis (SC).
“O que fizemos para Floripa é único no Brasil, a aplicação das propostas contidas neste documento é considerada como um passo importante para a cidade no caminho do desenvolvimento sustentável”, diz, entusiasmada, a arquiteta Maria Andrea Triana, coordenadora da equipe técnica. O documento sugere um conjunto de ações para promover a eficiência energética de todas as edificações da cidade, novas e já construídas, por meio de requisitos complementares ao código de obras e políticas públicas para eficiência energética das edificações. A iniciativa é um caminho apontado para Florianópolis implementar as estratégias até 2030.
Maria Andrea diz que essa espécie de código de energia já existe em outros países nas esferas municipal, estadual e nacional. No Brasil, temos algumas normas de desempenho térmico, lumínico, e o Programa Brasileiro de Etiquetagem, por exemplo, que é obrigatório apenas para edifícios públicos federais tanto novos quanto grandes reformas, e voluntário para residencial e comercial/serviços.
Entre diversas informações, o documento estima que em 2030 haja 45,01 milhões de metros quadrados de área construída no município. Esse aumento do estoque de edificações entre 2019 a 2030 corresponderá, em 2030, a 22% da área construída em Florianópolis, representando um consumo de energia equivalente estimado de 1.498 GWh no ano de 2030. A previsão é para todas as edificações do município, sendo baseada no consumo real que ocorreu até o momento – sem um plano de ação efetivo para reduzir o consumo de energia.
Apoio aos governos municipais
O Projeto Cidades Eficientes atua no apoio aos governos municipais para a promoção de ações visando a redução de gases de efeito estufa. A primeira etapa, em 2018, teve foco em ações de Eficiência energética, Uso racional de água, Geração distribuída e Mobilidade, relacionadas aos prédios públicos municipais. Foi feito um Diagnóstico dos Municípios Brasileiros e, posteriormente, dada assessoria para três cidades piloto: Jaboatão dos Guararapes, Sorocaba e Florianópolis.
As ações da primeira etapa já trouxeram resultados, segundo a coordenadora técnica da equipe da Prefeitura Municipal de Florianópolis, Cibele Assmann. “No caso de creche, por exemplo, que é similar a outra em tamanho e número de alunos, mas apresentou uma conta de luz alta, há a verificação dos motivos e a correção. É uma semente, como o projeto de energia solar nas escolas que está em andamento com a Celesc”, afirma Cibele.
Na segunda etapa, que encerra em junho de 2021, foram três os eixos de ação: gestão do consumo de energia e água nos edifícios, capacitação dos servidores e a adoção de políticas públicas, todas desenvolvidas junto a uma das cidades piloto: Florianópolis. Essa experiência poderá ser replicada em outras cidades brasileiras.
Uma das ações em Florianópolis foi a Gincana Energética com servidores de quatro dos prédios públicos, que experienciaram a eficiência no seu local de trabalho (a ação foi realizada antes da pandemia) por meio de uma atividade colaborativa baseada na Energy Treasure Hunt, desenvolvida pelo Departamento de Energia e a Agência de Proteção Ambiental dos Estados Unidos. Nela, os servidores ocupantes dos edifícios juntamente a especialistas e equipe do CBCS, identificaram os problemas e procuraram estratégias para melhorar a eficiência energética nesses prédios, prezando pelo baixo custo e alto retorno. “Várias pessoas de outros prédios manifestaram interesse em fazer a gincana, colocar adesivos. No final do projeto, vamos disponibilizar os adesivos para imprimir e inserir nos ambientes”, diz Maria Andrea.
Com relação à proposta do código ou capítulo de energia, foram incorporadas ao texto final as sugestões apontadas pela sociedade civil após consultar os setores envolvidos. Maria Andrea diz que uma das sugestões da consulta foi incluir, numa próxima etapa do projeto, a análise de custo benefício das práticas incluindo exemplos positivos que já existam na cidade.
Portaria
Como o Projeto Floripa Cidades Eficientes tem caráter permanente e irá influenciar na governança da cidade, foi proposta uma minuta de Portaria que atendesse alguns requisitos importantes de boas práticas nos prédios públicos da cidade: institucionalizar a gestão do consumo energético e de água, colocando como obrigatório às secretarias informar os dados; implantar uma coordenação específica para a gestão dos edifícios públicos e das políticas da cidade; realizar compras públicas que considerem, em primeiro lugar, dados de eficiência e depois o menor custo; e exigir que as edificações públicas e reformas contenham diretrizes de eficiência energética como etiquetagem comercial.
Segundo a coordenadora técnica da equipe da Prefeitura Municipal de Florianópolis, Cibele Assmann, a minuta está para análise final para posterior encaminhamento para o gabinete do prefeito.
Acesso a dados
Pela primeira vez, o trabalho foi a fundo no levantamento e análise de dados, na articulação com diferentes setores envolvidos no processo para lançar ações efetivas e permanentes. Foi desenvolvida uma plataforma de gestão de energia e água com acesso a dados abertos, para acompanhar o consumo dos prédios públicos com gráficos comparativos de cada edificação e do conjunto de prédios do município. Os dados são desde 2018, indicados por secretaria ou tipologia. “No prédio do SMDU/IPUF/Floram, por exemplo, está acessível o consumo mensal em 2018, o desempenho e qual foi o consumo por metro quadrado. O que mostra aqui é uma comparação entre todos os prédios dessa tipologia (administrativo) em Florianópolis e se o prédio está abaixo, na média ou acima. Esse prédio está 11% mais eficiente em relação aos outros dessa tipologia e o gráfico mostra também a emissão anual de CO² devida ao consumo de energia”, explica a arquiteta, apresentando a plataforma durante a entrevista.
Os dados mostram também os custos de energia da cidade. Os prédios públicos representaram em 2018 o maior custo de energia, 51%; 46% foram sistemas como iluminação pública. O setor da educação, por exemplo, teve o maior custo, 37%, porque inclui escolas básicas e creches; depois o administrativo com 23%; outros com 20%; e centros de saúde com 19%. “Todos os dados gerados durante o projeto são abertos e compartilhados, esse foi um compromisso que a prefeitura assumiu com o projeto, foi um grande avanço. Não é muito comum as cidades brasileiras possuírem gestão de consumo de energia”, diz. A ideia é mostrar ao poder público o quanto representa, por exemplo, 10% de economia nas contas da prefeitura a partir da adoção de políticas públicas para a gestão de energia com eficiência energética.
Mostrar dados é o primeiro passo para compreender o consumo, conscientizar as pessoas e partir para os ajustes necessários para gerar economia. “Tem vários estudos que dizem que mostrar dados já faz com você seja mais eficiente, se você não sabe o quanto gasta, não sabe o quanto tem que poupar”.
O site do projeto disponibiliza ainda o Guia de Melhores Práticas para os Municípios, o Diagnóstico das Cidades Brasileiras, realizados na primeira etapa do projeto. No trabalho com Florianópolis, foi desenvolvido o Manual de Compras Públicas Eficientes, esse último direcionado para os prédios públicos. “Acreditamos que os edifícios públicos têm que ser o modelo na questão de eficiência energética para depois passar para todos os prédios da cidade”, argumenta.
Capítulo de eficiência energética
Foram realizadas várias reuniões durante 2020 para discussão dos diferentes tópicos que seriam inseridos no texto final do documento “Requerimentos de Eficiência Energética como Política Pública para Edificações de Florianópolis”, que considera edifícios novos e já construídos. Participaram juntamente com a Prefeitura Municipal de Florianópolis, a equipe do CBCS, em parceira com o Laboratório de Eficiência Energética de Edificações – LabEEE - da Universidade Federal de Santa Catarina – UFSC, coordenado pelo professor Roberto Lamberts, que também integra a equipe do projeto e é coordenador do comitê de energia do CBCS. (veja a relação completa da equipe no final do texto).
São três as propostas elencadas: estabelecer requisitos mínimos obrigatórios para que as obras novas e reformas sejam energeticamente eficientes; propor outras políticas públicas para a eficiência energética das edificações no município; e estabelecer um roadmap ou roteiro para edifícios de zero energia considerando um cronograma previsto para implementação das políticas propostas.
Entre os requisitos mínimos obrigatórios, 50% do estoque construído de cada tipologia tem que ser contemplado com alguns itens que aumentem sua eficiência energética. Outra das políticas públicas são os incentivos adotados pela Prefeitura para a promoção de eficiência nas edificações. Para ir além das edificações públicas, o texto sugere expandir o programa de transparência de dados/benchmarking energético, que está disponível na plataforma on-line criada pelo projeto, para as edificações particulares.
As tipologias que foram apresentadas na consulta com associações e entidades do setor foram: residenciais unifamiliares (com área superior a 200 m² e habitações de interesse social); residenciais multifamiliares (com área superior a 2.000 m²); edificações mistas (unifamiliares + comerciais/serviços, com área superior a 200 m²); edificações mistas (multifamiliares + comerciais/serviços, com área superior a 2.000 m²); edificações comerciais e/ou de serviços (com área superior a 2.000 m²).
As propostas apontadas no documento reforçam práticas simples que ajudam na redução do consumo de energia como projetos que considerem a arquitetura bioclimática. Ou seja, um desenho que leve em conta o microclima do local de implantação do empreendimento para adoção da ventilação natural, iluminação natural, sombreamento ou outros elementos naturais. Isto aumenta o conforto dos usuários, reduz a necessidade de resfriamento e aquecimento por meio de condicionamento ambiental artificial, assim como a necessidade de utilização de iluminação artificial.
Para a eficiência energética, também é importante o uso de equipamentos eficientes ao longo da vida útil da edificação e, na medida do possível, o uso de fontes de energia renovável.
Roteiro para edifícios de zero energia
Conforme o Acordo de Paris (2015) existe mundialmente a meta de buscar o caminho para edificações de energia zero até 2050. A proposta do roadmap ou roteiro para edifícios de zero energia aponta o caminho para a cidade de Florianópolis. Segundo o Plano Nacional de Eficiência Energética (Pnef): edifícios com etiqueta de energia classe A devem seguir a seguinte ordem de obrigatoriedade: até 2020 para prédios públicos (política federal já existente), até 2025 para edificações comerciais e até 2030 para edificações residenciais.
Os avanços legais são necessários, mas não suficientes, para mudar um comportamento e conscientizar, por isso ações contínuas e uma gestão comprometida municipal são fatores essenciais ao projeto.
Convite
No próximo dia 2 de julho, das 14h às 15h30, será realizada a apresentação do "Programa Floripa Cidade Eficiente: ações e resultados - Estruturação de elementos de governança e políticas públicas em eficiência energética", atividade do Projeto Cidades Eficientes. O evento é on-line, acesse o formulário para inscrição.
Inscrições gratuitas no link: https://forms.gle/6fxsaCir5vR2hMpSA