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Chu Ming Silveira: conheça a arquiteta que criou o orelhão

Orelhão, concreto aparente e pós-caiçara são as marcas de Chu Ming Silveira (Foto: Djan Chu)

"Ming foi uma pessoa generosa, criativa e brilhante, assim como são sua arquitetura e seu design. Ela nunca teve a pretensão de ser mais do que sempre foi: uma talentosa arquiteta." - Clovis Silveira, então marido de Chu Ming Silveira

Nos últimos anos, por conta do avanço da tecnologia e da popularização dos celulares, os orelhões andam um pouco sumidos das nossas cidades. Porém, até a década passada, era muito comum vermos essas peças projetadas por Chu Ming Silveira por onde passássemos.  

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A arquiteta e designer sino-brasileira se destacou por criar o projeto para a proteção dos telefones públicos de nosso país. O orelhão fez com que ela se tornasse internacionalmente conhecida e trouxe popularidade para outras obras suas.  

No entanto, o seu legado vai além dessa importante criação. Chu Ming projetou diversas residências em concreto aparente em São Paulo e desenvolveu o que denominou de "arquitetura pós-caiçara" em Ilhabela e outras partes do litoral norte paulista. 

Sem dúvida, ela se tornou uma referência na arquitetura brasileira. Neste artigo, você saberá mais sobre essa grande profissional. Fique conosco!  

A história de Chu Ming Silveira 

Ficha consular de entrada da família de Chu Ming no Brasil
Ficha consular de entrada da família de Chu Ming no Brasil (Foto: Arquivo Nacional)  

Chu Ming nasceu em Xangai, na China, em 4 de abril de 1941. Ela era filha de Chu Chen, um engenheiro civil chinês que serviu nas forças armadas nacionalistas de Chiang Kai-shek.  

Após os comunistas levarem vantagem na Guerra Civil Chinesa, o pai de Chu Ming passou a ser perseguido, assim como outros opositores ao regime comunista. Isso fez com que a família se mudasse para Hong Kong, em 1949.  

Quando Chu Ming estava prestes a completar 10 anos, a família decidiu se mudar para o Brasil. A escolha teve como base o sonho de Chu Chen em ter uma fazenda na Amazônia.  

Então, eles partiram em uma viagem de navio que durou cerca de três meses, com escalas na Índia e na África do Sul. Cruzado o Atlântico, o desembarque foi no Rio de Janeiro, onde passaram um certo tempo. Até que perceberam que, antes de atingir seu objetivo, deveriam se estabelecer na cidade de São Paulo

Assim, fixaram residência no bairro de Pinheiros, onde já se formava uma pequena colônia de chineses pós-guerra.

Antes de se mudarem para o Brasil, os pais de Chu Ming se converteram ao catolicismo, em Hong Kong, tendo batizado seus quatro filhos com nomes ocidentais. O escolhido para a menina Chu Ming foi Verônica. Aqui, ela passou a ser chamada de Veró por eles.

Depois do Ensino Médio, Chu Ming ingressou na Faculdade de Arquitetura da Universidade Presbiteriana Mackenzie, que concluiu em 1964.

No mesmo ano, seus pais se mudaram para Manaus, onde fundaram a famosa Loja Oriente. Mais tarde, tiveram ainda um escritório de importação e exportação de artigos refinados oriundos da China.

Entretanto, Chu Ming decidiu permanecer em São Paulo para desenvolver sua carreira de arquiteta.

Perfil Chu Ming Silveira
Chu Ming Silveira (Foto: Orelhão

Em 1968, ela se casou com o engenheiro paulista Clovis Silveira, adotando seu sobrenome. O novo casal teve dois filhos: Djan e Alan, nascidos em 1971 e 1976, respectivamente.

Alan Chu seguiu os passos da mãe e hoje é um conhecido arquiteto, atuante em São Paulo, Brasília e Alto Paraíso de Goiás. Djan Chu é empresário e fotógrafo profissional especializado em arquitetura. 

Chu Ming faleceu jovem, em 18 de junho de 1997, de microembolia pulmonar, em São Paulo.

Uma carreira profissional brilhante 

Chu Ming Silveira foi Chefe do Departamento de Engenharia da CTB
Chu Ming Silveira foi Chefe do Departamento de Engenharia da CTB (Foto: Orelhão)  

 

Ming, em mandarim, tem significados bem especiais. Um deles é "brilhante". E podemos dizer que assim foi a carreira da arquiteta.  

Um ano após a formatura, em 1965, ela inaugurou seu próprio escritório em São Paulo, em que desenvolvia projetos de edifícios residenciais.

Em 1966, Chu Ming começou a trabalhar como arquiteta na Companhia Telefônica Brasileira (CTB), em São Paulo. Na posição de chefe da engenharia de prédios, coordenava o projeto e a construção das subestações de telefonia em edifícios espalhados pela capital.

Foi nessa época que ela desenvolveu seu projeto de design mais famoso, que ficou sendo conhecido como orelhão.

Depois do lançamento do orelhão, Chu Ming trabalhou como arquiteta na Serete S.A. Engenharia, empresa francesa especializada em arquitetura de edifícios industriais.

Em seguida, ela atuou no departamento de Arquitetura do Consórcio Nacional de Engenheiros Consultores (CNEC), desta vez em projetos de grande porte, como barragens e usinas hidrelétricas. Uma experiência que, certamente, muito contribuiu para as suas obras seguintes.

Casas em concreto aparente são marcas de Chu Ming Silveira na arquitetura brasileira
Casas em concreto aparente são marcas de Chu Ming Silveira na arquitetura brasileira (Foto: Djan Chu)  

Em 1978, Chu Ming decidiu dar maior abrangência à sua carreira de arquiteta, dedicando-se também ao Design e à Comunicação Visual.

Alguns anos depois, em 1987, voltou a atuar com seu próprio escritório de arquitetura e design, desenvolvendo especialmente projetos de residências e de design na capital e no litoral paulista.

Os principais projetos desenvolvidos por Chu Ming Silveira 

O projeto do orelhão fez com que o nome de Chu Ming Silveira viesse a se tornar reconhecido nacional e internacionalmente. Mas suas obras não pararam por aí. Veja, a seguir, alguns de seus principais projetos.

Orelhinha  

Chu Ming Silveira criou diversos projetos de protetores de telefones públicos, sendo o orelhinha e o orelhão os popularmente mais conhecidos
Chu Ming Silveira criou diversos projetos de protetores de telefones públicos, sendo o orelhinha e o orelhão os popularmente mais conhecidos (Projeto: Chu Ming Silveira)

Quando trabalhava na CTB, Chu Ming Silveira assumiu o desafio de criar um protetor para os telefones instalados em áreas públicas das cidades brasileiras.

Com isso, as pessoas deixariam de ir a estabelecimentos como bares e padarias para fazer uma ligação, pois teriam sempre um telefone por perto.  

A ideia era que fosse criada uma cabine telefônica que unisse funcionalidade, beleza e, claro, durabilidade.  

Na época, o governo já tinha descartado produzir cabines como as tradicionais europeias, em que o usuário precisa entrar no espaço para usar o telefone.   

Basicamente, era necessário pensar em uma solução mais barata, mas com boa acústica.  

Foi aí que Chu Ming teve a ideia de aplicar a forma do ovo - que, de acordo com ela, é simples e acusticamente eficiente para as chamadas telefônicas.

Foram criados inicialmente dois modelos de protetores, batizados pela companhia telefônica de Chu I e Chu II, em homenagem à arquiteta.

O primeiro deles era produzido em acrílico laranja e instalado em locais fechados, como estabelecimentos comerciais e repartições públicas. Esse tipo tem o protetor transparente, para aumentar o espaço visual do ambiente.

Ele é menor do que o orelhão e fixado na parede. Por isso, ficou popularmente conhecido como orelhinha. Ainda hoje é encontrado em diversos edifícios que possuem lojas e áreas com movimento de pessoas.

Orelhão 

Projeto da cabine telefônica criada por Chu Ming Silveira
Projeto da cabine telefônica criada por Chu Ming Silveira (Projeto: Chu Ming Silveira)  

Mas os desafios não pararam por aí. A arquiteta também precisou pensar em um protetor de telefone que pudesse ficar exposto ao sol e à chuva.

Foi então que decidiu pesquisar um material bastante resistente: a fibra de vidro. Oficialmente chamado de Chu II, tinha modelos nas cores laranja e azul.

As primeiras cidades brasileiras a receberem o Chu I e o Chu II foram Rio de Janeiro e São Paulo, nos dias 20 e 25 de janeiro de 1972. Suas criações, portanto, estão prestes a completar 50 anos.  

Na época do lançamento, o poeta Carlos Drummond de Andrade dedicou uma das crônicas que escrevia no Jornal do Brasil para enaltecer a novidade:  

De repente — notaram? — a rua melhorou em São Paulo, com o aparecimento do telefone-capacete. […] A verdade é que a rua ficou sendo outra coisa, com as pessoas descobrindo que não precisam mais fazer fila no boteco ou na farmácia para dar um recado telefônico.  

O orelhão é a principal criação da arquiteta Chu Ming Silveira
O orelhão é a principal criação da arquiteta Chu Ming Silveira (Foto: Orelhão)  

Logo nos primeiros meses de uso, a população começou a chamar a invenção de “orelhão”, pela forma similar a uma orelha.  

O orelhão se tornou um sucesso e democratizou o acesso à telefonia. Afinal, até quem não tinha dinheiro para instalar uma linha telefônica em casa podia comprar fichas (e mais tarde cartões) para usar o telefone público e se comunicar com quem desejasse.  

Atualmente, são poucos os orelhões encontrados nas ruas. A evolução da telefonia móvel e os novos meios de comunicação, como a internet, fizeram com que ele perdesse a função. Mesmo assim, o item ficou registrado na história e na memória afetiva do povo brasileiro.  

Bancas de flores e jornais de São Paulo 

Na década de 1970, Chu Ming Silveira desenvolveu projetos para a Prefeitura de São Paulo
Na década de 1970, Chu Ming Silveira desenvolveu projetos para a Prefeitura de São Paulo (Projeto: Chu Ming Silveira)  

Com o sucesso do orelhão, a Prefeitura de São Paulo convidou Chu Ming Silveira para criar projetos de bancas de jornais e bancas de flores para a capital paulista em 1974.  

A ideia era ter itens de fibras de vidro — mesmo material do orelhão — que combinassem funcionalidade e estética.   

Casas em concreto aparente  

Casa em concreto aparente tem vigas e tubulações à mostra, em um estilo que se assemelha ao industrial
Casa em concreto aparente tem vigas e tubulações à mostra, em um estilo que se assemelha ao industrial (Foto: Djan Chu)  

Um dos grandes projetos arquitetônicos de Chu Ming Silveira é a casa onde ela viveu com sua família, no Morumbi, em São Paulo.  

É uma obra diferenciada, sem fundações clássicas, elaborada com sapatas corridas, paredes e coberturas em concreto. Estas, em vez de serem horizontais, são inclinadas e funcionam como grandes calhas para a água da chuva. 

Não há paredes paralelas, de modo que a acústica interna dos ambientes é perfeita. O concreto das paredes foi moldado com tábuas de pinho horizontais, que marcam seus nós, imprimindo uma textura especial.

Resumidamente, a casa é térrea, distribuída em ambientes com níveis diferentes, que acompanham o desnível do terreno. 

A obra utilizou, como materiais de construção, apenas concreto aparente, tábuas de madeira nos pisos, vidros pivotantes fumê de segurança, pouquíssima alvenaria, portas de metal e aço inoxidável nos nichos.

A arquiteta projetou outras residências em São Paulo que seguem o mesmo estilo.  

Casas em Ilhabela  

Terreno em Ilhabela deu espaço a casas no estilo pós-caiçara. Na construção ao fundo, nota-se um
Terreno em Ilhabela deu espaço a casas no estilo pós-caiçara. Na construção ao fundo, nota-se um "orelhinha" enfeitando parede lateral
(Foto: Djan Chu)  

Chu Ming Silveira também ficou bastante conhecida por desenvolver projetos de residências em Ilhabela, conhecida estância localizada na Ilha de São Sebastião, no litoral de São Paulo. Ela denominou o estilo desses seus projetos como “pós-caiçara”.

Trata-se de uma estética rebuscada, que reflete toda a experiência que a arquiteta teve ao longo da vida, dos projetos industriais às casas em concreto aparente.

Tudo começou na década de 1980, quando ela e seu marido adquiriram um terreno no Morro de Santa Tereza, bairro Indaiá.

Nos anos 1990, a área de aproximadamente 5 mil m² deu lugar à primeira das casas na qual Chu Ming aplicou seu estilo pós-caiçara, que já mostra o quão diferenciado ele é.

A construção se apoia sobre grandes rochas e aproveita os materiais locais em uma arquitetura sustentável. Mesmo com a proximidade do mar, é livre de umidade.  

Os interiores das casas projetadas por Chu Ming Silveira em Ilhabela se integram à natureza da região
Os interiores das casas projetadas por Chu Ming Silveira em Ilhabela se integram à natureza da região (Foto: Djan Chu) 

A estrutura é de granito, alvenaria, concreto e madeira de massaranduba. Portas e janelas são de pinho de riga, obtidas de demolição de residências clássicas de São Paulo da época das fazendas de café, todas restauradas e trabalhadas, como uma verdadeira obra de arte.

São muitas quinas e pontas, que fogem do tradicional formato retangular. O telhado é projetado com diversas águas, em uma combinação harmoniosa.

Para permitir a contemplação do visual do mar, do canal de Ilhabela e das montanhas do continente de forma panorâmica, a frente da casa, voltada para o pôr do sol, conta com vidros por toda a parte. Eles são pivotantes, o que é ótimo para a ventilação cruzada, tudo isso em uma altitude de cerca de 150 m.

Outra característica importante é a infraestrutura elétrica aparente, como nos projetos industriais. Um dos pontos positivos disso é a facilidade de fazer manutenções, pois não é preciso quebrar nada.

Para o piso, cimento queimado e madeira. Tudo isso de acordo com a milenar Escola Chinesa da Forma, ou seja, os princípios do Feng Shui.  

Ao longo do tempo, outras construções foram erguidas no terreno, formando-se uma "residência espalhada" completamente integrada à natureza.

Certamente, Chu Ming Silveira entrou para a história da arquitetura brasileira, pois desenvolveu mobiliários urbanos icônicos que marcaram e ainda marcam presença em nossas vias e praças públicas.

Para saber mais sobre a vida, a obra e o legado da arquiteta, acesse o site oficial dedicado ao orelhão!  

Foto de destaque: Orelhão, concreto aparente e pós-caiçara são as marcas de Chu Ming Silveira (Foto: Djan Chu)

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