O espaço da Oca Parque do Ibirapuera está atualmente preenchido pela exposição de um dos artistas mais conceituados do planeta. Ai Weiwei faz arte com materiais simples e ideias complexas, questiona os valores da vida contemporânea e deixa para os olhos uma espécie de poesia visual que, enquanto a uns encanta, a outros incomoda.
Nascido em Pequim, no ano de 1957, Ai Weiwei já chegou ao mundo cercado pelo universo artístico. Isso porque seu pai, Ai Qing, também artista e poeta, já fazia sucesso na China e no mundo, mas também representava polêmica.
Sendo assim, com apenas um ano de idade, Ai Weiwei conheceu o que era se desprender das raízes, ao seguir seu pai, exilado em campo de trabalho - centro de detenção onde os internos são forçados a realizar trabalho como punição.
Apenas aos 17 anos, ele volta para a capital chinesa, onde começaria os estudos de animação na Beijing Film Academy. Porém, suas raízes já estavam soltas.
Ai Weiwei em Nova York
Pouco depois de seu retorno a Pequim, Ai Weiwei decide ganhar o mundo e vai para Nova York aprofundar-se em arte e design. Ele passa a dedicar seu tempo a desenhar retratos de rua e, ao mesmo tempo, consegue alguns bicos que o mantém.
Nessa época em que vagava pelas ruas da Big Apple, Ai Weiwei descobre também o prazer da fotografia. Tudo que parecia interessante era registrado em imagens que posteriormente virariam um álbum. Essas fotos resultaram numa coleção que hoje é conhecida como o álbum New York photographs.
De volta para a China
No ano de 1993, Ai Weiwei decide voltar para a China. Lá ele colabora com uma série de artistas experimentais e participa da publicação de três livros voltados para o universo da arte.
Ai começa a parecer mais polêmico quando funda o estúdio de arquitetura Fake Design, e é cocurador da exposição de arte Fuck Off, junto com Feng Boyi. Ainda assim, até aí, não sofre grandes repressões.
Um artista que questiona
Em 2005, Ai Weiwei é convidado a criar um blog na maior plataforma da internet da China e por quatro anos passa a publicar reflexões artísticas, visões sobre arquitetura e algo que incomoda um pouco mais o governo chinês: críticas sociais e a política vigente. Isso faz com que seu blog seja colocado fora do ar, mas o torna extremamente popular, incentivo para continuar a se manifestar, dessa vez por outras redes, como o Twitter.
Ao mesmo tempo que questiona, ele assessora artisticamente projetos de grande porte, como o projeto arquitetônico do estádio nacional Ninho de Pássaro, construído para os jogos olímpicos de Pequim. Uma de suas obras mais famosas.
Em 2008 ocorre o terremoto de Sichuan. Ai Weiwei critica a falta de transparência do governo chinês com relação aos nomes e números de mortos divulgados. Ele cria uma equipe para pesquisar e registrar as condições pós-terremoto. E compila mais de 5 mil nomes e informações das vítimas no projeto “Investigação dos cidadãos”. Mais um blog que seria bloqueado pelas autoridades chinesas.
Em 2010, Ai Weiwei é preso pela primeira vez, em prisão domiciliar. Para ele, a prisão serviria para impedi-lo de realizar a confraternização planejada para denunciar a demolição de seu estúdio em Shanghai, que, recém-construído, era questionado pelas autoridades por não ter a permissão necessária. Acusação esta que ele contesta.
No ano de 2011, um pouco antes de pegar um voo para Hong Kong, o artista é interceptado sob a alegação de que seus procedimentos de partida estavam incompletos.
Na ocasião, seu estúdio em Pequim é revistado por mais de 40 policiais, inúmeros itens são confiscados e seus funcionários interrogados. Dessa vez, o artista passa três meses preso em local secreto e suas punições são bem mais severas.
Tudo isso, ao invés de pará-lo, deu ao artista ainda mais argumentos para as questões que ele coloca em sua arte.
Conversamos com Marcello Dantas, curador da exposição de Ai Weiwei na Oca Ibirapuera. Para ele, Ai Weiwei não é necessariamente um artista crítico: “Acho que ele levanta bandeiras fundamentais, mas se você não estiver interessado nisso vai encontrar um escultor superinteligente que desafia a construção arquitetônica, o sistema de blocos e o pensamento articulador”.
Um artista sem fronteiras
Somente em 2015, Ai Weiwei tem devolvido seu passaporte e pode voltar a viajar para o exterior. Ele não perde tempo.
Em 2017, lança o aclamado documentário Human Flow (Fluxo Humano), filmado em 23 países, sobre refugiados, seus dramas e esperanças.
“Ele entende o mundo de forma universal e não nacional. Aceita as questões da humanidade e não apenas os problemas regionais”, reforça Dantas.
Ai Weiwei no Brasil
São Paulo tem a oportunidade de conhecer esse artista e sua obra até dia 20 de janeiro na Oca Ibirapuera.
Para Marcello Dantas, curador da exposição Raiz, é a ocasião de encontrar um artista singular: “É um dos poucos artistas na história que pode ser considerado relevante nos campos Artes Plásticas, Cinema e Arquitetura”.
Para além de ser uma pessoa única, Ai Weiwei conserva traços que o fazem próximo de todos, inclusive do nosso povo. “Ai Weiwei também tem muito humor e irreverência assim como o brasileiro, nisso há forte identificação”, entrega Dantas.
Mais de 70 mil pessoas já estiveram na atual exposição. Ai Weiwei ficou por três semanas no Brasil e participou de inúmeros encontros com o público. “Ele é um bicho selvagem, mas pode ser de imensa doçura”, descreve Dantas, que completa: “Ele funciona muito bem na esfera pública, mas tem uma fala mansa e para dentro. Isso surpreende as pessoas que esperavam um performer”.
Segundo o curador, a descoberta do jeito de pensar de Ai Weiwei ganha a simpatia do público. “Ver as pessoas simples falarem que a ‘exposição do China ali no parque é que é a boa’ me encanta”, relata.
No espaço, estão expostas algumas de suas grandes obras como SunFlower Seeds e Straight, duas obras seminais. Na exposição, as raízes também provocam grande impacto pela dimensão, ideia e posicionamento. “A Oca é um espaço brilhante por permitir uma revisita à obra por vários ângulos”, explica Dantas.
Quanto ao nome da exposição, Raiz, a explicação pode ser tanto simples quanto complexa. “É uma exposição sobre Raízes, literalmente e metaforicamente”, esclarece Dantas, porém, ele conta uma curiosidade interessante: “Também se chama Raiz por que o sobrenome de Weiwei é Ai e isso são as vogais de raiz".
Dantas aprofunda sobre as metáforas que podem ser recolhidas dessas obras: “As raízes se comunicam de alguma forma por debaixo da terra e nossa principal missão, hoje, é desenterrar raízes para nos lembrarmos de quem somos e de onde viemos, assim podemos repensar o futuro”.
Entretanto, falar de raízes implica também abordar a cultura, as experiências transculturais e as fronteiras. “Como usar a arte para permitir que as pessoas vejam o mundo além dos seus times de futebol, partidos políticos e hinos patrióticos. Precisamos pensar de outra forma”, convida Dantas.
A exposição Raiz, de Ai Weiwei, fica em cartaz na Oca Parque do Ibirapuera até dia 20 de janeiro de 2019. Seus horários são de terça a sábado das 11h às 20h. Aos domingos e feriados, fecha 1 hora mais cedo, às 19h.
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